Tão
longe e tão perto
Nessa
sexta feira chuvosa que pospõe a enchente de São José, sinto-me saindo do
exílio. Pode parecer um antagonismo visto que me encontro em quarentena, mas
refiro-me ao retorno às crônicas. A libertação das letras apesar da reclusão do
corpo. Daria música de Chico. Confesso que esse tempo sem escrever me levou a
inúmeras reflexões e exercícios de contenção e de parcimônia. Muitos
aprendizados e conclusões. Por inúmeras vezes coçaram os dedos e efervesceu a
mente, mas não a ponto de quebrar o ciclo da desintoxicação de opinião. Mas
todo ciclo tem seu fim. E seu recomeço. E aí entro no tema da crônica de hoje. Quem
é responsável pelo retorno? Qual tema? O afortunado rompedor dos grilões do
silêncio. O corona vírus. Ele mesmo. O assunto da vez. Mas gostaria de focar em
um ponto específico. Nada de tecnicidades, conjunturas políticas, exageros ou teorias
da conspiração. Gostaria de falar sobre a distância e a proximidade em tempos
de pandemia. Vocês já notaram o que o isolamento pode provocar nas relações
humanas? Observaram o quanto a comunicação digital ficou mais consistente,
necessária e cuidadosa? Observaram retornar os telefonemas aos pais, avôs, tios
e parentes que há tempos não falávamos? Observaram o quanto o tempo se dilatou?
Eu tenho observado. E mais ainda, vocês observaram as modificações nas relações
daqueles que estão cumprindo quarentena em conjunto? Digo principalmente pais e
filhos, mas se estende a todo conjunto familiar. Surgiram oportunidades de
conversas antes adiadas, afazeres em conjunto antes postergados e
principalmente atenções antes suprimidas. O moinho do cotidiano muitas vezes
transforma em pó a convivência humana. Não essa convivência de trabalho ou
proforma dentro de casa. Digo a convivência real. Afetuosa. Simbiótica de
humanidade. A solidariedade que brota diante das agruras do vírus se reflete
nas relações humanas. Somos todos seres humanos e devemos nos lembrar disso no
que tange a nossa convivência harmoniosa. Nem que as vezes quem nos lembre isso
seja um ser microscópico. E o principal. Pensemos em perpetuar essas
modificações de convivência quando todo esse maremoto passar. Porque assim
teremos certeza de que aprendemos algo e evoluímos como seres pensantes diante
das adversidades da vida.
Guilherme
Augusto Santana
Goiânia, sexta-feira 20 de março de 2020