sexta-feira, 23 de setembro de 2016

sobre mocinhos e bandidos


Sobre mocinhos e bandidos

 

         

Essa semana estava matando tempo e resolvi fuçar no Netflix à procura de entretenimento barato e fácil. Passando os olhos na seção documentários me deparei com o “Buena Vista Social Club”. Gosto demais. Apertei o play.

As cenas de Havana e dos músicos liderados por Compay Segundo chamaram a atenção de meus filhos que se encontravam no mesmo ambiente, porém com os olhos no iPhone e similares. Cometi o erro (ou não) de contar sobre o embargo econômico à ilha, ao tentar exaltar a importância daqueles músicos para a cultura de Cuba. Pronto. Estavam abertas as portas para as perguntas. E do tipo que não tem jeito de responder sem fazer uma linha histórica. Vamos a ela.

Procurei de maneira simplificada, e tentando prender a atenção dos meninos, explicar alguns fatos históricos para melhor entendimento. Falei da revolução ocorrida na Rússia em 1917 e suas consequências na divisão do mundo entre capitalistas e socialistas (nesse trecho eles particularmente se interessaram muito pelo fuzilamento do Czar Nicolau II e sua família). Entrei no pós segunda guerra mundial e o imperialismo das nações vencedoras com a formação da União Soviética. Passei pela revolução de Cuba liderada pelos irmãos Castro e Che Guevara, mostrando o alinhamento do país ao bloco socialista e consequente embargo econômico por parte dos Estados Unidos e aliados. Cheguei a guerra fria onde as potências latiam horrores, mas não chegaram a morder (por pouco), e nesse interim toquei de leve no assunto das milenares guerras no oriente médio com fundo religioso e econômico bancadas pelas grandes potências imperialistas.

Logicamente que as mentes infantis não conseguem conceber muito bem as motivações das guerras, embargos econômicos e jogos de war da vida real, então os protestos foram inevitáveis ao fim da explanação. Tentando contornar a revolta, parti para dar a boa notícia. A de que o Presidente Obama tinha, ao final de 2014, iniciado as tratativas para derrubar o embargo econômico à Cuba. Pude perceber naquele momento, o brilho nos olhos deles quando falei do Presidente americano e lembrei-me do seu último e fantástico discurso na ONU proferido essa semana. A falta do peso nas costas como líder da maior potência do mundo está lhe fazendo bem. E fazendo bem também ao planeta. Seus discursos e principalmente seus atos históricos, ao final do mandato, tem mostrado o quanto o pensamento infantil deveria ser levado em consideração. Fatos como embargos, guerras, intolerâncias de qualquer ordem simplesmente não deveriam existir porque não fazem sentido. As crianças não veem lógica nisso e nós adultos teimamos em contextualizar e tentar justificar aquilo que não tem explicação. Talvez por isso Obama seja tão idolatrado entre as crianças. Não como um super-herói que pilota caças supersônicos e parte para a guerra defendendo seus cidadãos contra russos, alienígenas e extremistas religiosos. Isso é muito anos 80. Mas simplesmente como alguém que tem questionado aquilo que nunca fez sentido. Logicamente que num mundo real onde não existem bandidos e mocinhos, isso possa parecer uma utopia. Concordo. Mas hão de concordar também, que o mundo seria bem melhor se visto sob essa ótica lógica das crianças. Bem melhor.                   

         

              

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 23 de setembro de 2016

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

O homem nu


O homem nu

 

           

          Essa semana foi marcada pela nudez masculina. Coisa ainda pouco comum mesmo para os dias contemporâneos. Diferentemente da feminina, que povoa desde sempre a História da humanidade, a dos homens causa uma certa estranheza e com certeza comentários volumosos. A bola, quer dizer, as bolas da vez foram atribuídas ao deslize do modelo e pescador Paulo Zulu. A foto do nu frontal pipocou nas redes sociais e causou uma avalanche de notícias, comentários, mêmes e suspiros. Eu mesmo não era para ter visto (e nem queria) a tal foto. Porém ela apareceu como por milagre em um grupo do WhatsApp. Sem nem direito meu a querer baixa-la ou não. Simplesmente ela apareceu. E o pior é que foi no grupo restrito da família onde se encontra minha santa mãezinha e minhas irmãs (dedurei). Coisa constrangedora. Mas no meu caso simplesmente olhei, fiz uma piada daquelas inerentes aos homens e passei. Mas não me furtei a refletir sobre a vergonha do autor da foto. O personagem principal. Não entrarei no mérito de aos cinquenta e poucos anos de idade o cidadão conservar um corpo exemplar. Não é essa vergonha que estou falando. Refiro-me ao fato de, mais uma vez, a celeridade das redes sociais ter colocado em saia justa uma pessoa pública. E a vergonha vergonhosa de ter sua intimidade exposta assim de forma tão escancarada. Mas tenho certeza que será uma vergonha passageira. Logo outro famoso comete o mesmo descuido e a fila anda. Assim esperamos e acredito também que assim espera o Zulu.

 

          Outro cidadão que foi pego com as calças curtas, ou melhor, sem as calças essa semana, foi nosso ex Presidente Lula. Despido de maneira Hollywoodiana pelo Procurador Deltan Dallagnol e colegas. Uma exposição pública vexatória com direito a gráficos, círculos e setas enfáticas mostrando todo o esquema de lavagem de dinheiro de que é acusado o ex Presidente. Não entrando no mérito da questão de culpabilidade do indiciado e nem do exagero político que cometeu o Ministério Público Federal, senti vergonha de ver aquele homem público ser exposto daquela maneira. Mas diferentemente do nosso personagem do primeiro parágrafo, a vergonha não esteve presente na atitude do segundo personagem de nossa crônica. Os choros dos mesmos ocorreram de forma igualitária, porém com motivações diferentes. O primeiro de vergonha e o segundo de retórica. Mas independente das reações, os dois foram expostos em sua nudez para todo um país espiar como num Big Brother da falta de vergonha. Ou o excesso dela. De qualquer forma, no caso do Zulu, espero que ele se recupere, continue tocando sua vida e nunca mais apareça em pelo na minha timeline. Já em relação ao ex Presidente espero o contrário. Que não esqueçamos de conferir os detalhes de sua nudez e tenhamos, como sociedade, temperança e sabedoria de puni-la se a mesma restar comprovada criminosa.                

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 16 de setembro de 2016

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

adaptação, eis a questão


Adaptação, eis a questão

 

          Principio a crônica de hoje com uma cena forte. Aqueles que têm estômago fraco o melhor é se retirarem da sala. Imaginem um domingo de manhã com toda sua família deitada na cama assistindo TV e tomando café. Aí numa dessas de atravessar de um lado para o outro do quarto, seu dedo se encontra com o pé da cama. Agudo. Imaginaram? Mas não foi o dedinho não. Aquele que Deus fez com sistema de articulação dupla para aguentar esse tipo de topada. Foi o dedo vizinho ao dedão. Esse mesmo. O que não sabemos nem o nome de tão insignificante se faz em nossas vidas. Pois bem. O barulho foi de algo quebrando. Olhei para cama em busca das caras dos expectadores. Todos me olhavam com emoji de espanto. Experimentei todas as cores do arco íris e sensações no estômago. Dor. Mas capaz de não ser nada. Tenho que adaptar. Improvisamos uma tala com palito de picolé, calcei o sapato e partimos para um almoço de comemoração. Besteira. A dor me enviou ao pronto socorro. Raio-x. Fratura. Imobilização. Ainda bem que não engessam mais. Agora usa bota ortopédica. Tira a bota toda hora. Dá até para dirigir. Fácil. Engano. Piorou. Muleta. Sem colocar o pé no chão. Tempo incerto. Mas como vou dirigir? Trabalhar? Levar meus filhos na escola? Tomar banho? Nesse momento senti-me um inválido. Um saco de carne jogado dependendo da boa vontade de outrem. Inútil. Pensamento de desistência. Foi aí que me lembrei das Paraolimpíadas do Rio que se iniciam por esses dias. Recordei-me de uma reportagem que havia assistido há pouco de uma ciclista brasileira paraplégica. O esforço hercúleo que ela e a família fizeram para se adaptar ao esporte. À vida. Vítima de um acidente de carro. Reportagem de chorar dias sem parar. Horas de tristeza e horas de alegria. Qual o ingrediente principal ela utilizou para seguir a vida? Adaptabilidade. Uma das Leis Universais. Inexorável. Independente de fatos trágicos e obtusos, o ser humano necessita se adaptar. Quer seja a situações físicas ou psicológicas. Adaptação para evoluir com ser humano. Aqui sentado nesse computador poderia ficar horas escrevendo e lamentando sobre as limitações desse meu estado precário. Mas não o farei. Lembrar-me-ei, em todos os momentos de fraquejo, dos atletas paraolímpicos e principalmente daquela ciclista. De sua adaptabilidade, resiliência e força de vontade. E se precisar subir no pódio, o farei. Mesmo que seja de muletas e com a ajuda dos que ao meu lado se encontram.

 

Boa sorte aos atletas paraolímpicos em mais esse desafio. Vocês já são campeões.   

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 02 de setembro de 2016