sexta-feira, 27 de julho de 2018

o canudinho da vez


O canudinho da vez

 

          Estava levando a filha mais velha aos inúmeros lugares que eles vão nas férias, quando escutei alguma coisa sobre a campanha de abolição do canudinho plástico no rádio. Confesso que não tinha pensado a fundo no significado daquilo até aquele momento, mas como a filha tinha recém passado por um episódio de compadecimento por uma causa, resolvi lhe perguntar sobre o assunto. Logicamente que ela me respondeu: “legal”. Não satisfeito pedi que discorresse mais sobre os porquês. Ela explicou do lixo e da morte de tartarugas por conta dos artefatos, até então inofensivos, de plástico. Depois da conversa pus-me a refletir sobre o assunto e os convido a fazer o mesmo. Com certeza é legal uma campanha para evitar a morte de tartarugas por asfixia. Não é? Tenho certeza que quase ninguém seria contra. Mas vamos dar profundidade nisso? Antes do canudinho ser considerado vilão mor da sociedade mundial, foram as sacolas plásticas. E antes delas foi o gás de geladeira. E antes dele foi o petróleo. E assim teceremos uma lista infindável de condenados de crime ambiental. Agora a pergunta nevrálgica seria: Como esses artefatos foram parar nas vias aéreas de uma tartaruga, ou nas vias gástricas de um golfinho ou até mesmo nas penas de uma ave migratória? Eles apareceram lá por milagre? Quando fazemos essa pergunta e notamos que existe uma cadeia imensa entre usar o canudinho e o mesmo ser encontrado em um cadáver de tartaruga, chegamos a conclusão que o simples fato de usarmos um artefato de plástico não reflete em quase nada o problema. E aí bate-me, não sei se em vocês ocorreu o mesmo, uma sensação de que estou sendo usado numa campanha no mínimo rasa. O meu compadecimento foi usado nisso. Cheguei a olhar torto para os canudinhos. Mas refazendo-me do sentimentalismo, vejo que na verdade, estamos culpando a vítima. Não a tartaruga, mas o canudo. Visto que o verdadeiro culpado disso tudo somos nós. Olha que conclusão interessante. Ou você sabe exatamente o que é feito com o lixo depois que sai da sua casa? Ou você acompanha toda parte de reciclagem e tratamento dos resíduos que provocamos? Não né? Nem eu. E isso estamos falando só de lixo já produzido. Pensa no consumismo de maneira geral e no que isso reflete de absorção de recursos naturais. Sentiu o drama? E aí vem a conclusão mais importante de toda essa prosopopeia: Deveríamos fazer uma campanha para mudar o ser humano, não os canudos de plástico. Aliás, a campanha deve começar dentro de cada um. Uma auto campanha. Somos responsáveis incondicionalmente pelos nossos atos e pelas consequências dos mesmos. Eu sou responsável por mudar minhas atitudes e entregar um cidadão melhor a sociedade. Cada um o é. Senão, como diria Marcelo D2, lava as mãos como Pilatos achando que já fez sua parte. Pensemos.           

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sábado 27 de julho de 2018

perder e ganhar


Perder e ganhar

 

          Quando vi a filha chorando copiosamente não resisti ao ímpeto paterno de consolá-la. Desses ímpetos que trazemos junto com o instinto, mas que é potencializado imensamente pela sensibilidade. Queria dar colo, queria explicar, queria relativizar, queria tirar a decepção com a mão. Sim decepção. As lágrimas caiam de pura e singela decepção. Era a primeira Copa do Mundo que ela acompanhava com dedicação. Com afinco (sorte a dela não o ter feito nos 7x1). Gritava vai Phillipe, dribla Neymar, avança William como gente grande. Que entende o que diz. Por isso o choro valia. Cada lágrima valia. E ela só queria verte-las. E o pai só contê-las. Ou tentar pelo menos. Mostrei-lhe a bandeira que carregava desde a Copa de 94. Mais derrotas do que vitórias. Contei da seleção favorita de 82 e do fiasco de 90. Narrei os gols da França na final de 98 e da mesma em 2006. Falei da Holanda em 2010. Todos entalados na garganta. Mas ela continuava no choro copioso. Não tinha passado por aquilo. Não sabia quem eram Caniggia, Paolo Rossi, Zidane, Henry. Sabia que a sua Seleção tinha sido eliminada. A sua Seleção. E por isso chorava. Aí o pai percebeu que as decepções não podem ser explicadas, narradas, inculcadas. Devem ser vividas, sentidas, assimiladas. Assim como as vitórias. Por mais que eu explicasse a sensação do pênalti perdido por Baggio, ou o gol de falta de Branco contra a Holanda ou ainda a falta de Ronaldinho Gaúcho contra a Inglaterra, ela não sentiria o gostinho do que foi. A sensação. O êxtase. Têm coisas na vida que carecem de explicação. Ou não tem explicação. Ou são explicáveis por si só. Ou sentidas. Assim são as alegrias e decepções da vida. Vitórias e derrotas. E olha que estamos só falando de futebol aqui, sendo que a regra se estende por praticamente tudo. No momento que entendi, deixei que ela chorasse. As lágrimas foram feitas para serem vertidas. Nos momentos de alegria e de tristeza. Porque elas expressam e curam. Até que o luto vire saudade e a euforia, boa lembrança.        

  

           Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sábado 07 de julho de 2018