Nelsons, Mários e Agenores
“ Naquela mesa ele sentava sempre e me dizia sempre o que é viver melhor. Naquela mesa ele contava histórias que hoje na memória eu guardo de cor”. Coisa que faço as sextas é escutar música ao invés de jornalismo. Esta sexta passei o dia ouvindo Nelson Gonçalves. Aí muitos vão se perguntar: “ou o Coveiro está ficando doido ou ele mentiu sua idade”. E eu confesso. Escuto Nelson Gonçalves! E gosto! Escuto também Ataulfo Alves, Adoniram Barbosa e Francisco Alves. Pronto falei! Passei o dia também com os olhos marejados. Amanhã, se estivesse entre nós, meu avô Agenor faria 100 anos. E foi ele que me ensinou a gostar das vozes melódicas dos cantores de serenata. Por isso passei o dia escutando Nelson. Para tentar matar um pouco da saudade.
Lembro-me com clareza de chegar a sua casa e correr direto para a estante de madeira da sala. Madeira de verdade, escura, encerada. Não essas porcarias de compensado que temos hoje em dia. Abria logo as portas pesadas e ficava namorando os discos de carvão com rotação diferente. Olhava as capas e ficava imaginando quem eram as pessoas que estavam estampadas nelas. Impreterivelmente estava tocando alguma coisa e o som, na maioria das vezes, chiado. Mas para mim soava como límpido. Soava como música de casa de avô. Coisas de cabeça de menino. Escutava aqueles vozeirões e sentia o cheiro da madeira e das coisas guardadas que só casas de avós têm. Tinha também café e biscoito de queijo. Esses por alcunha de minha avó Natália. Sentava a comer e a observar o relógio cuco que se misturava a voz de Nelson, Ataulfo, Adoniram e Chico Alves. Para quem visse de fora poderia parecer uma cena Dantesca, mas para mim era cena da minha infância. Passava tardes inteiras. E assim seguiram os anos até o dia da perda de meu avô. Já tinha me tornado um adulto, mas marcado indelevelmente pelo gosto musical de épocas passadas.
No mesmo dia 26 de novembro de 1911 em que nascia meu avô, nascia também o compositor, poeta e ator Mário Lago. Autor de músicas inesquecíveis como Aurora e Amélia e de frases de efeito que marcaram a história do nosso país. Aí muitos podem estar se perguntando: “além da coincidência das datas de nascimento, o que mais havia de comum entre as duas pessoas citadas?”. E eu respondo mais uma vez. De uma certa maneira essas duas pessoas, Mário e Agenor, deixaram um legado que influenciou o gosto musical de alguns. No caso de Mário, sua produção cultural formou toda uma geração de brasileiros e suas frases são citadas como exemplos de vida e de otimismo. No caso de Agenor, seu gosto musical marcou esse que vos fala. Sem me preocupar com a quantidade de seres atingidos, pensemos que o sentido da vida seja esse. Deixar um legado. Influenciar de alguma maneira aqueles que virão após. Logicamente que pensando sempre em uma herança positiva. Bons exemplos deixam bons frutos. Eis aqui uma prova disso. Por isso nesse dia passei com os olhos marejados. E quando Nelson cantou: “Eu não sabia que doía tanto, uma mesa num canto, uma casa e um jardim. Se eu soubesse o quanto dói a vida, essa dor tão doída, não doía assim. Agora resta uma mesa na sala, e hoje ninguém mais fala do seu bandolim. Naquela mesa tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim.”, não consegui segurar as lágrimas que marejavam meus olhos. Saudades. De Nelson de Mário e principalmente de Agenor.
Guilherme Augusto Santana
Goiânia, 25/11/11