sexta-feira, 31 de julho de 2015

gourmetizando a crônica


Gourmetizando a crônica

 

 

            Esses dias estava eu cronicamente mudando o canal da televisão em busca de diversão passageira e entretenimento ocioso. Sabe quando na verdade você não quer achar nada, mas simplesmente ficar mudando o canal enquanto desanuvia os pensamentos? Pois era isso que acontecia. Porém comecei a perceber uma coisa interessante em meu ato despretensioso. Os canais oscilavam entre programas de viagens e culinária. Ou era um ou o outro. Numa sequência quase homogênea. Era de Master Chef Ilhas Seicheles até Merendeiros do Faina. De Viagens Paradisíacas até Top Ten dos destinos toscos. Tinha para todos os gostos. Amadores cozinhado para profissionais e vice versa. Renomados tentando ensinar técnicas francesas para candidatos ao estrelato sempre aos berros. Concursos valendo dinheiro e fama fugaz. Cozinheiros Michelin fazendo pratos comuns e outros gourmetizando o arroz com feijão. No rol das viagens a diversidade também é grande. Os destinos clássicos em contraponto com os exóticos. Os top ten e os piores têm também. Viagens para heteros, gays, casais em lua de mel e religiosos. Dicas e pitacos dos conhecidos e dos anônimos. Custava achar um canal que não falasse ou de viagem ou de culinária. E ainda tem os que misturam os dois. Destinos da América Latina que servem comida oriental. Cozinhando peixe no interior do Quênia. Parece que basicamente o povo vive no avião e comendo. E com isso nomes e destinos antes desconhecidos tornam-se comuns aos nossos ouvidos e olhos. Que atire a primeira pedra quem nunca ouviu as frases: “ah se o cheiro dessa comida pudesse passar pela TV” ou “esse é sem dúvida um dos lugares mais lindos que já visitei”. E com isso o mundo vai se desfiando sob os nossos olhos atentos. Não quer dizer que não goste, pelo contrario, sou um fã de carteirinha. Acho extremamente interessante a capacidade que a globalização tem de nos mostrar coisas e sensações que talvez nunca possamos experimentar in loco. A questão a que me refiro é o excesso de informações com esse caráter. Uma avalanche de gourmetização. E a indústria da mídia tem que se reinventar a todo minuto para tornar atrativos os produtos que vendem e manter a capacidade de prender os consumidores. Coisas simples e antigas como uma dona de casa cozinhando bolo de fubá já não atraem mais. E aí pode estar o erro. Ou o exagero que leva ao erro. Estamos subindo um degrau de maneira artificial. Achamos que somos super viajados e com um paladar refinadíssimo pelo simples fato de termos uma overdose de informações. Já até sentimos o gosto do foie gras e sabemos a tonalidade exata do mar do Caribe sem sequer ter provado e nem estado. E outro erro. Quem é que falou que esse “up grade” de gostos e milhagem nos torna pessoas melhores? Quer outro erro ainda maior? Será que perderemos a capacidade de achar graça nas coisas simples e comuns? Melhor pensar mais um pouco para responder antes que passemos a não gostar mais da comida da mamãe e achemos nossa casa o pior lugar do mundo.          

 

 

    

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 31 de julho de 2015

sexta-feira, 17 de julho de 2015

os "entas"


Os “entas”

 

            Lembrei-me de uma foto que tirei hoje de manhã que não consigo tirar da mente. Nela estavam minha filha e duas amiguinhas acordando dentro de uma barraca de camping com sorrisos de orelha a orelha. Coisa normal de crianças que passaram a noite em conversas animadas sobre bonecas, colegas, filmes, sonhos e desejos. Conversas entremeadas por sacos e sacos de salgadinhos e pipoca. Dormir deve ter sido o que menos fizeram, afinal tinham dois fatores externos além do papo animadíssimo. Havia a minha cadela Bella que por vezes fazia o papel de vigia de barracas e por vezes fazia o papel de sem teto procurando buracos para entrar nas mesmas barracas. Imagino até que se pensasse estaria se indagando o porquê de todos estarem dormindo dentro daquelas coisas quentes e ela do lado de fora no frio. E o outro fator externo era a barraca do lado das meninas que pertencia aos meninos. Meu filho e um amigo a ocupavam e ocupavam o ouvido dos vizinhos com palavras em decibéis só atingidos por crianças quando querem chamar a atenção. Digamos que estava instalada uma praça de guerra entre barracas. Cada um querendo chamar mais a atenção que o outro. E assim foram até umas três da manhã quando Morpheus conseguiu o intento de seduzi-los para seu mundo. Quando levantaram bem cedo, pois o sol começava a castigar as barracas, só conseguia perceber a alegria pelos momentos vividos naquela semi noite. Nem frio, nem guerrinha de sexos e nem cachorro tentando invadir tirou o brilho daquele momento inusitado passado entre amigos. E fiquei a pensar com meus botões: “O que faz esses meninos felizes?”.

            Lembrei que no dia que se iniciou o acampamento, era meu aniversário. Redondos quarenta. Número emblemático e cabal. Daqueles que fazem com que a sua retrospectiva seja ampla e profunda. Igual banho de sábado. E com certeza passei parte do dia realizando o tal balanço de vida. Relembrando os momentos, conquistas e tombos. E olha que foram muitos de todos. Momentos para guardar e momentos para esquecer (e dizem que depois dos quarenta você começa a esquecer das coisas, então estou torcendo para isso acontecer com os ruins). Conquistas que enchem meus olhos de lágrimas de alegria e tombos que os enchem por decepção. Mas cada fato vivido com intensidade em sua singularidade. Aliás, entendo que a receita de uma vida bem vivida, ao final, se resume a uma coleção de momentos bem vividos. Óbvio isso né? Mas a vida é obvia e simples. Nós é que às vezes a complicamos com nossas manias de grandeza, empáfia ou mesquinhez. Simples assim. Mas uma pergunta não saia da minha mente: “o que me faz feliz?”.

            Lembrei que nesse mesmo dia do acampamento dos meninos e do meu aniversário, era para estarmos na beira do Rio Araguaia. Há milhares de quilômetros de onde estou escrevendo essa crônica. Essa era a programação. Comemorar meus quarenta anos em um dos lugares que mais amo nessa vida. Mas intercorrências médicas nos fizeram desistir da viagem na madrugada da saída. Coisas da vida. Por isso estava comemorando minha data emblemática assando uma carne de improviso na minha casa enquanto os meninos entusiasticamente armavam as barracas no quintal para passar a noite. Em um dado momento, pilotando aquela churrasqueira, parei e fiquei observando a movimentação alegre das pessoas. Era para ser algo decepcionante, afinal não era aquele o plano, mas tudo fluía como se nada tivesse acontecido. Como se aquele fosse o plano original. E assim senti a vida andando em sua simplicidade. Como se tivesse chegado a uma encruzilhada e escolhido qual caminho seguir. Como já fiz milhares de vezes na minha vida. Aí entendi o que me fazia feliz. Ter nas mãos os destinos da minha vida. Poder escolher.  Assim foram os primeiros quarenta anos e assim serão os próximos, e os próximos e os próximos.

                    

             

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 17 de julho de 2015

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Pedala!


Pedala!

 

           

Essa semana foi divulgada a notícia de que o Papa Francisco receberá no Vaticano cinquenta prefeitos de todo mundo para discutir, entre outros temas, a nova Encíclica papal. Para quem não está familiarizado com o tema, as encíclicas são cartas solenes, doutrinárias ou dogmáticas dirigidas pelo Papa ao clero católico de todo o mundo.  Trocando em miúdos, o livro de regras da Igreja Católica Apostólica Romana. Nada com que se estranhar, visto que os sumo pontífices costumam se valer desse artifício regimental para pastorear seu rebanho. O que causa estranheza, e, diga-se de passagem, estranheza boa, é o fato de que a Encíclica Laudato Si (Louvado Seja) trata do assunto sustentabilidade ambiental. Olha se não é um fato inusitado. Já não bastasse a perspicácia com que o Papa tem tratado com os assuntos dogmáticos da Igreja, agora está opinando e influenciando o aspecto ambiental mundial. Laudato Si eu me atreveria a dizer     a ele.  Atitude de se aplaudir de pé. Mas não vou aqui desfiar a minha tietagem em relação ao pop Francisco porque não é esse o ponto que quero abordar. Mas vale o registro. Voltando ao encontro com os líderes municipais, o convite foi feito a sete prefeitos de cidades brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Salvador, Porto Alegre e Goiânia. Logicamente que todos se sentiram extremamente honrados com o convite e devem ter pretensões intensas de discussão com o revolucionário Papa argentino. Eu também as teria se estivesse no lugar deles. Por conta disso fiquei recordando a via crucis que a cidade de Goiânia, onde sou nascido, criado e residido, tem percorrido para tentar se tornar um pouco mais sustentável. Forante as propagandas exageradas dos governos, a cidade sempre teve orgulho de ser bastante arborizada e de certa forma sempre acolheu a ideia com muito gosto. Mas sempre permaneceu nesse diapasão. Porém há muito tempo tem-se criado um senso comum de que somente árvores não bastam. É preciso tratar o assunto com mais profundidade. Pois não se trata somente de verde. E nos últimos tempos o assunto mais discutido foi o trânsito e suas toneladas de poluentes lançados na atmosfera. Esse é um fato recorrente e crítico. Quem está contido dentro dos muros da cidade muitas vezes não percebe a má qualidade do ar, envenenamento lento, gradual e letal. E é numa dessas vertentes de tentativa de diminuição da poluição e consequente melhoria do trânsito da metrópole, que tomou força a ideia das ciclovias. Substituição de parte do transporte veicular motorizado pelo mecânico humano. Mas tem sido um parto. Chuva de críticas. Ácidas. Não tem adiantado os exemplos de cidades mundiais que mudaram seu perfil de transito e aderiram às duas rodas como solução. Não tem adiantado números e mais números mostrando a melhoria nos índices. Isso tudo esbarra na incredulidade de uma população cansada de ser ludibriada e leniente em relação ao seu status quo. Todos querem mudar, mas contanto que não afete o seu modo de viver. Todos querem ceder, mas contanto que o outro ceda primeiro. Todos querem melhoria, mas contanto que não cause transtornos. Não que a implantação de ciclovias vá resolver o problema de uma vez por todas. Não. Mas faz parte de um arcabouço de pontos que incluem também transporte público mais eficiente, melhoria na infraestrutura da cidade e uso de veículos menos poluidores. Mas isso também é uma mania que emana da nossa cultura. A inocência ignorante e pueril de que os problemas se resolvem num piscar de olhos com soluções mágicas e instantâneas. Coisa de conto de fada. E assim vamos seguindo nosso caminho ao calvário pregando um discurso e fazendo outro. Como em diversos assuntos nesse nosso país. Mas não vamos esmorecer. Vamos rir de nossas próprias desgraças. Por isso peço liberdade para uma sátira poética. Antes que venham me crucificar. Penso que falta ao nosso prefeito, para concretizar de vez as ciclovias na nossa cidade, contratar os especialistas no assunto. Para Secretário de Esportes vamos chamar o Robinho e suas pedaladas futebolísticas. Para Secretário de Finanças vamos encampar o Ministro Levy e suas pedaladas fiscais. E por fim para Secretário de Governo convidaremos o Presidente Eduardo Cunha e suas pedaladas legislativas. Pronto! Quem disse que não somos o país do pedal?! Logicamente que tudo com a benção do Papa. Amém.    

 

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 10 de julho de 2015

sexta-feira, 3 de julho de 2015

rimas pobres: o retorno


rimas pobres: o retorno

 

Já era pra ter parado

Mas esse mundo é só gozação

Segue o resumo de assuntos anunciado

Amarra a corda do calção.

 

Gente sumida emitiu opinião

O mundo sertanejo se revoltou

Foi igual soltar um rojão

E a rede social bombou.

 

O cidadão quase foi execrado

Por uma turba renitente

Opinião em tom exacerbado

Liberdade de expressão imprudente.

 

A maioridade penal estava no trajeto

Mas a redução foi barrada

De repente apareceu outro projeto

Era o Eduardo Cunha e sua pedalada.

 

E segue delicada contenda

Assunto polêmico que divide a população

Uns acham que é problema

Outros acham que é a solução.

 

Na Copa América a Argentina voa baixo

Numa eficiência que é um colosso

Paraguai foi o último capacho

Antes no deles que no nosso.

 

Isso nos faz lembrar a Alemanha

E a goleada no cangote

Que conseguiu a façanha

Da Grécia levar um calote.

 

A operação Lava Jato fez mais uma vítima

Num apetite deveras atroz

Na cadeia mais um termina

Tem mais fases que o Mario Bros.

 

Teve Ministro sendo vaiado

Numa falta de senso incrível

O cidadão indignado

Com a situação econômica horrível.

 

É uma falta de educação

Esse tipo de parada

Só não sei se do Ministro lambão

Ou da população maltratada.

 

Mas a pior foi um adesivo

De uma sandice certa

O mau gosto lascivo

A Presidenta de perna aberta.

 

Talvez a mandioca seja a explicação

Da causa de tanto libido

E causado tanta confusão

Esse tubérculo de duplo sentido

 

Nesse mundo inverossímil

Parece um livro de colorir sem contorno

Toda forma de expressão é possível

Por isso as rimas pobres tem retorno.

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 03 de julho de 2015