sexta-feira, 17 de julho de 2015

os "entas"


Os “entas”

 

            Lembrei-me de uma foto que tirei hoje de manhã que não consigo tirar da mente. Nela estavam minha filha e duas amiguinhas acordando dentro de uma barraca de camping com sorrisos de orelha a orelha. Coisa normal de crianças que passaram a noite em conversas animadas sobre bonecas, colegas, filmes, sonhos e desejos. Conversas entremeadas por sacos e sacos de salgadinhos e pipoca. Dormir deve ter sido o que menos fizeram, afinal tinham dois fatores externos além do papo animadíssimo. Havia a minha cadela Bella que por vezes fazia o papel de vigia de barracas e por vezes fazia o papel de sem teto procurando buracos para entrar nas mesmas barracas. Imagino até que se pensasse estaria se indagando o porquê de todos estarem dormindo dentro daquelas coisas quentes e ela do lado de fora no frio. E o outro fator externo era a barraca do lado das meninas que pertencia aos meninos. Meu filho e um amigo a ocupavam e ocupavam o ouvido dos vizinhos com palavras em decibéis só atingidos por crianças quando querem chamar a atenção. Digamos que estava instalada uma praça de guerra entre barracas. Cada um querendo chamar mais a atenção que o outro. E assim foram até umas três da manhã quando Morpheus conseguiu o intento de seduzi-los para seu mundo. Quando levantaram bem cedo, pois o sol começava a castigar as barracas, só conseguia perceber a alegria pelos momentos vividos naquela semi noite. Nem frio, nem guerrinha de sexos e nem cachorro tentando invadir tirou o brilho daquele momento inusitado passado entre amigos. E fiquei a pensar com meus botões: “O que faz esses meninos felizes?”.

            Lembrei que no dia que se iniciou o acampamento, era meu aniversário. Redondos quarenta. Número emblemático e cabal. Daqueles que fazem com que a sua retrospectiva seja ampla e profunda. Igual banho de sábado. E com certeza passei parte do dia realizando o tal balanço de vida. Relembrando os momentos, conquistas e tombos. E olha que foram muitos de todos. Momentos para guardar e momentos para esquecer (e dizem que depois dos quarenta você começa a esquecer das coisas, então estou torcendo para isso acontecer com os ruins). Conquistas que enchem meus olhos de lágrimas de alegria e tombos que os enchem por decepção. Mas cada fato vivido com intensidade em sua singularidade. Aliás, entendo que a receita de uma vida bem vivida, ao final, se resume a uma coleção de momentos bem vividos. Óbvio isso né? Mas a vida é obvia e simples. Nós é que às vezes a complicamos com nossas manias de grandeza, empáfia ou mesquinhez. Simples assim. Mas uma pergunta não saia da minha mente: “o que me faz feliz?”.

            Lembrei que nesse mesmo dia do acampamento dos meninos e do meu aniversário, era para estarmos na beira do Rio Araguaia. Há milhares de quilômetros de onde estou escrevendo essa crônica. Essa era a programação. Comemorar meus quarenta anos em um dos lugares que mais amo nessa vida. Mas intercorrências médicas nos fizeram desistir da viagem na madrugada da saída. Coisas da vida. Por isso estava comemorando minha data emblemática assando uma carne de improviso na minha casa enquanto os meninos entusiasticamente armavam as barracas no quintal para passar a noite. Em um dado momento, pilotando aquela churrasqueira, parei e fiquei observando a movimentação alegre das pessoas. Era para ser algo decepcionante, afinal não era aquele o plano, mas tudo fluía como se nada tivesse acontecido. Como se aquele fosse o plano original. E assim senti a vida andando em sua simplicidade. Como se tivesse chegado a uma encruzilhada e escolhido qual caminho seguir. Como já fiz milhares de vezes na minha vida. Aí entendi o que me fazia feliz. Ter nas mãos os destinos da minha vida. Poder escolher.  Assim foram os primeiros quarenta anos e assim serão os próximos, e os próximos e os próximos.

                    

             

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 17 de julho de 2015

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