Cria tipo menino!
Quando eu era criança
pequena lá em Barbacena (mentira que sou goianiense do pé rachado) tinha mania
de achar que tinha razão. Toda razão do mundo. Não podia ser questionado e
muito menos acusado de estar errado, afinal eu era a razão em pessoa. Chamava
isso de obstinação. Pulso firme. Inflexível. Estava certo até quando estava
errado. E algumas vezes (senão a maioria) quando percebia que podia ter uma
nesga de engano permanecia firme na minha posição como um exército de um homem
só. Inabalável. Intransigente em minha certeza racional. Racional em minha
certeza intransigente. Ou seja, era um reizinho déspota. Isso em uma criança
chega a ser bonitinho. Fofinho. “Olha que gracinha dando birra de teimosia”.
Conforme você vai crescendo a coisa vai mudando. O que era bonitinho e fofinho
passa a ser preocupante. Mas tem sempre o da família que solta um: “mas ele não
está roubando. Isso é de família”. Pronto! Mais uma justificativa. Deficiência
familiar. Tem que ser preservada. Tradição que se deve carregar. Ensinar filhos
e netos. Joias da coroa. Observaram que agora já passou à categoria de
deficiência né? Antes era característica. Individualidade. Agora já passa para
o rol do negativo. Mas é de família. Herança. Não podia fugir disso. Né não? Né
não! Foi quando comecei a perceber como determinadas deficiências são
acalentadas com carinho e se transformam em monstros devorando seu caráter.
Viram bichos indomáveis que aterrorizam as pessoas que convivem com você. O que
fazer já que tinha a razão? Isolar numa luta solitária contra o mundo? Partir
para um ataque suicida e passar de louco? E se eu não estivesse com a razão
sempre? Imaginem essas ideias passando na cabeça de um adolescente. Foi isso
que ocorreu comigo. Como agir? Primeiro identificando o monstro. Seu modo de
agir e de operar. Suas recorrências e situações de fragilidade. Depois passando
a limitar suas ações. Não alimentando seu ego e nem passando a mão na sua
cabeça. Aos poucos ele vai diminuindo e diminuindo até se tornar um bicho de estimação.
Mas não me engano que ele é traiçoeiro. Pode crescer a qualquer momento.
Debaixo do meu nariz. Voltar a aprontar das suas. Aliás de vez em quando
apronta. Mas com menor frequência do que fazia em outros tempos. Chego a ficar
de camarote as vezes observando ele tentar morder meu calcanhar. Mas não me
iludo. Sei que ele me acompanhará até os meus últimos dias a fazer companhia. Penosa
companhia. Resta-me somente nesse tempo mostrar quem manda em quem. Não deixar
nunca que se invertam os papeis. E resta-me ainda o mais importante. Passar
adiante. Aos meus filhos e netos. Uma herança nova. Fácil? Nem de longe.
Possível? Totalmente. Afinal, quem tem razão, dá razão.
(Crônica dedicada carinhosamente a Kim
Jong Un. Cria tipo menino!)
Guilherme Augusto Santana
Goiânia, sexta feira 08 de janeiro de 2016
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