sexta-feira, 1 de novembro de 2013

ah a danada da saudade...

Sempre quando vai chegando a data de finados  se aproxima a danada da saudade. São pessoas especiais que fazem falta na vida de todos nós. Quem não tem uma avó como a Ná (que apresentarei p/ quem não conhece) em sua vida e se recorda sempre com uma sensação boa? Com a permissão do leitor postarei uma crônica escrita em 2006 por conta do falecimento da minha avó. Ao lerem pensem nos seus entes queridos que deixaram saudades.




 

 

         Quem não conheceu a Ná não sabe o que é biscoito de queijo quente servido a qualquer hora do dia ou da noite. Podia estar entupido de comida que se não se servisse de pelo menos um, era desfeita. Mal entrava e já escutava: vou “quentar” uns biscoitos, antes mesmo do “bença” e do “Deus te abençoe”. Por isso que a mesa tinha que ser grande: em um canto a canastra e em outro, sempre a postos, o lanche da Ná. Quem não conheceu a Ná não sabe o que é o autêntico frango com quiabo e angu lá do interior de Minas. Servido com jogos de mesa completamente descombinantes: talheres de um jogo, pratos diferentes. Nenhuma peça igual à outra. Deve ser fruto dos seus muitos anos de casamento e da mania adquirida do Agenor de não jogar nada fora. Quem não conheceu a Ná não sabe o que é rezar o terço à maneira dos Santana: O Moreno disparado na frente e a Natália tentando diminuir a marcha. Logicamente que entre uma Ave Maria e um Pai Nosso faziam o planejamento do dia em voz alta e tinham as pequenas discussões sobre dinheiro. Nunca entendi como eles não se perdiam no meio do terço. Anos de prática.

        

Mas, quem conheceu a Ná, saiu muitas vezes de sua casa cheio de pacotes de bolacha ou uma lata de doce em calda que fazia parte da sua dispensa. Mas escutou muitas vezes também o Agenor gritar de lá que não ia mais dar dinheiro p/ fazer supermercado porque ela dava tudo para os outros. E ela se intimidava? Que nada. Falava: “esconde este pacote de bolacha que depois eu tiro dinheiro da carteira dele e compro mais”. Mesmo que não gostasse da bolacha era ótimo presenciar esta cena. Quem conheceu a Ná sabe que não se podia falar mal de nenhum filho dela, nem mesmo de brincadeira. Partia logo em defesa, mesmo sabendo que o acusado tivesse aquele defeito. Às vezes fazia só para ver a reação dela. Parecia uma leoa em defesa dos filhotes.

        

Agora, quem gostava da Ná, sabe que a data do Natal a partir de agora perde um pouco o seu brilho, porque há seis anos perdemos o Capitão e agora perdemos a motivação para seguir navegando. Sabe que agora só restam saudades mesmo. Sabe que o presépio, os presentes, as músicas, o parabéns não mais voltarão a acontecer, só nas nossas recordações. Quem gostava da Ná sabe que vai ficar um vazio, uma cadeira vazia, um quê de não me deixe, uma sensação de que a vida não será mais a mesma sem ela. Mas sabe também que ela deixou uma semente, aliás, deixou uma plantação inteira de amor, dedicação, carinho e fé. E isso é o que fica.

        

Oh Moreno ! Arruma o canto da mesa aí, que o biscoito quente e o café estão subindo.

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 23/02/2006

 

* Crônica escrita em memória de Natália Barbosa Reis, minha avó.

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