quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Fred Picadinho


Fred Picadinho
 
 
 
            Sabe qual a expressão mágica para um glutão como o que vos fala? “O melhor...”. Pensem se não é irresistível: “o melhor bolo de chocolate do mundo”, “a melhor lasanha caseira do Brasil”, “o melhor quibe da América Latina”. Para mim parecem aqueles desenhos animados onde a cheiro da comida sai da panela e vem flutuando até o nariz e carrega o comensal até o prato. Há muito tempo tinha ouvido falar do picadinho do restaurante Fred na capital federal. Intitulado “o melhor picadinho de Brasília”. Pronto. Atraiu. Bastou um amigo convidar para almoçar lá que de imediato a boca encheu de água pensando no acepipe. O amigo “convidante” ainda deu a opção de mudar de restaurante, mas meu estômago já tinha fotografado o picadinho. Não podia ser outra coisa.
 
            O restaurante se parece com milhares da capital. Entrada estreita e cheio de executivos. Somos rapidamente acomodados e nem olhamos o cardápio. Picadinho para dois. Logo chegam as panelas. Isso mesmo. As panelas fundo triplo da Tramontina vão direto a mesa. Arroz branco (pasmem não ser arroz com brócolis a comida típica de Brasília), farofa daquelas fininhas que causam engasgo nos desavisados (pasmem novamente por não ser farofa de ovo, outro ícone comparável ao arroz com brócolis). Até aí nada de novidade. Mas nesse ponto vem uma banana a milanesa... frita a perfeição... Sabe aquelas bananas que não parecem que foram fritas? Sem uma gota de óleo sobrando. Ou foram feitas nessas modernidades de panela que frita sem óleo ou o cidadão secou no papel toalha. Posto os três acompanhamentos no seu prato, vem a frigideira gigante com o picadinho que é despejado fumegante na sua frente. Filé picado na ponta da faca e champignons ao molho roti. O cheiro é de enlouquecer. E não esqueçamos a cereja do bolo, ou melhor dizendo, o ovo pochê com a gema ainda mole. Aí é só usar generosamente o Tabasco e partir para o abraço. Quem inventou essa combinação deveria ganhar um prêmio Nobel da gastronomia. Pensam que acabou? Não. O garçom fica passando com a frigideira fumegante e “cheirenta” entre as mesas fazendo a reposição dos pratos. Não recomendo para quem é desprovido de limites para comer. Corre um sério risco de “empanturramento”.
 
            E aí vem a pergunta crucial: é o melhor picadinho de Brasília? Respondo com toda certeza: O melhor que já comi na capital. Se alguém tiver outra opinião ou souber de outro melhor, aceito o convite para contra prova. Afinal sou um glutão democrático. Direito da ampla defesa como princípio básico. E os que não discordam, convido a provarem. Vale a pena.      
   
 
 
 
Guilherme Augusto Santana
Goiânia, sexta feira 27 de novembro de 2014
 
 
 
Fachada do Fred
 


O melhor picadinho de Brasília

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Francisco, Joaquim, Antônio e outros brasileiros


Francisco, Joaquim, Antônio e outros brasileiros

 

            Batizado Francisco, porque não haveria de ser aceito seu nome africano, Zumbi nasceu na Serra da Barriga, antiga capitania de Pernambuco. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1600. Nascido dentro do Quilombo dos Palmares, desde cedo se mostrou um bravo guerreiro e teve por destino assumir o comando do quilombo até a sua extinção nos idos de 1694. Foragido só conseguiu resistir até o dia 20 de novembro de 1695 quando foi preso, morto, decapitado e levado as autoridades para comprovação do feito. Zumbi poderia ter sido confundido com milhares de negros que foram despejados no Brasil da era colonial e que perderam suas vidas lutando pela vida dos conterrâneos. Milhares e milhares que morreram anonimamente sem ao menos uma lápide para guardar a memória de seus nomes. Assim poderia ter sido Francisco. Mas quis o destino que a coroa portuguesa amargasse 95 anos de resistência do quilombo mais famoso da história brasileira e transformasse seu último líder em mártir. Entrou para História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente não quis livrar o Brasil do julgo português mas sim ter uma vida liberta para seus pares.
 
            Batizado Joaquim, porque havia de ser filho legítimo de portugueses, Tiradentes nasceu no Distrito de Pombal, antiga Capitania de Minas Gerais. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1700. A alcunha veio do ofício de dentista, que por sinal não foi o único, tendo exercido as ocupações de tropeiro, minerador, comerciante, militar e por derradeiro mártir (ou bode expiatório para o lado B). Conseguiu resistir até 21 de abril de 1792 quando foi executado, esquartejado e teve seu sangue utilizado para lavrar a certidão de cumprimento de sua sentença, julgado pelo crime de lesa-majestade. Tiradentes foi um dos muitos que se voltou contra o julgo e a sede de riquezas da coroa portuguesa. As veias abertas do ouro e pedras despejando além Tejo enquanto a maioria dos brasileiros vivia na precariedade. Milhares e milhares que lutaram pelas injustiças instituídas e não tiveram nem uma linha escrita nos livros. Assim poderia ter sido Joaquim. Mas quis o destino que seu nome estivesse no meio de outras tantas figuras importantes e, por menor hierarquia, fosse dado de boi de piranha a sanha de “justiça” dos portugueses. Entrou para a História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente quis livrar o Brasil do julgo de seus ascendentes, mas com certeza queria mesmo era não ser vilipendiado com os impostos exorbitantes.
 
            Batizado Antônio, porque seus pais religiosos faziam questão, Conselheiro nasceu na cidade de Quixeramobim, antiga Província do Ceará Grande. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1800. Parece que sua sina estava ligada a religiosidade e penitencia, pois além do desejo atroz de seus pais pela vida clerical, fez-se seu ofício a advocacia dos pobres e desvalidos. O infortúnio da descoberta da traição de sua esposa levou Antônio Conselheiro a se exilar na região de Sobral onde lhe restou a penitência e a peregrinação. Muitos se juntam a ele, já um fora da lei, e surgiu então o Arraial de Canudos, renomeado pelo seu criador como Belo Monte. Tornou-se desafeto do recente governo republicano por supostamente abrigar recém-libertos escravos, pobres de toda ordem e fanáticos religiosos que viam em Conselheiro um milagreiro do sertão. Conseguiu resistir até 22 de setembro de 1897 quando morreu de causas desconhecidas. Matado ou morrido. Teve o túmulo profanado, a cabeça cortada e levada à Faculdade de Salvador para estudos. Nunca mais se juntou corpo e cabeça. Conselheiro foi dos muitos que por uma desilusão pôs-se a peregrinar e juntar os desvalidos em torno de suas asas como um pai que alenta o sofrimento alheio. Milhares e milhares que lutaram pelos mais pobres e nunca tiveram seu busto na praça de nenhum pobre vilarejo. Assim poderia ter sido Antônio. Mas quis a República do Brasil que ele servisse de exemplo para todos aqueles que ousassem enfrentar o novo e garboso Estado Republicano. Entrou para a História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente não quis retornar à monarquia, mas tão somente dar alento ao sofrimento dos desvalidos.
 

Levando em consideração as descrições acima responda a seguinte questão do ENEM:

 

1)    Apesar de se tratarem de três figuras históricas ilustres, somente um deles foi alçado ao posto de herói brasileiro, tendo sido agraciado com um feriado nacional por ordem da sua data de falecimento e também cidade batizada com seu nome. Baseado no conhecimento da sistemática de produção da História Brasileira, em consonância com o preconceito racial ainda predominante no país e com a intolerância religiosa crescente na sociedade brasileira, e ainda coadunando com a máxima de que “a História é escrita pelos vencedores”, de qual desses personagens estamos nos referindo?

 

Vale uma balinha.   

 
 



Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 21 de novembro de 2014

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

nosso quem cara pálida?


Nosso quem cara pálida?

           

            No fim dos anos noventa, estava eu a serviço na cidade de São Paulo quando recebi um telefonema do diretor técnico da empresa na qual trabalhava, me designando missão de representa-lo em uma concorrência pública no Rio de Janeiro. Como não é de meu feitio recusar serviço, ainda mais no Rio, atendi de bate pronto à convocação. Separei uma mala de mão com um short, camiseta e chinela. Não dormiria no Rio, mas estando tão próximo à praia não poderia deixar de molhar meus pés rachados de goiano nas águas salgadas do mar. Trajando terno, que essas formalidades exigem, comprei a passagem da ponte aérea e embarquei na manhã seguinte. Quando a aeronave apontava para descer no Santos Dumont, principiou a tocar o Samba do Avião de Tom Jobim. Acho que fazem isso de propósito para que você fique ainda mais maravilhado com aquela cena bela. Naquele momento dei-me conta que não conhecia a cidade maravilhosa. Havia estado no Rio, mas apenas de passagem em aeroportos. Emocionado desci e já parti direto para o compromisso que tinha hora marcada. Cessada a obrigação, alcancei um taxi e perguntei ao motorista qual era a praia mais próxima. Copacabana foi a resposta. Nada mais clássico. Embarquei no taxi e mandei seguir para a praia. No caminho pensei que passaria vergonha, pois usava terno, notadamente inapropriado para o local para onde me destinava. Chegando a Copacabana pude perceber meu erro. As tribos que desfilavam por seu calçadão eram infindáveis. Ondas de turistas em todos os trajes, cores, línguas e classes sociais. Mais a vontade corri ao banheiro público e fiz a troca de roupa colocando o terno na mala de mão. Sentei-me na primeira barraca na beira do calçadão, pedi uma cerveja gelada e a partir daquele momento pude observar o porquê do Rio ser a cidade mais cantada em versos e prosas. Acordei do sonho quando percebi que tinha de voltar a São Paulo e de imediato desfiz a troca de roupas e parti novamente rumo ao aeroporto. Muitas coisas tinham me impressionado no Rio. Literalmente as coisas que fascinam a todos. Mas uma em particular por estar ligada a minha profissão e naquela época ser ícone de empresa bem sucedida. A concorrência tinha acontecido na sede da Petrobras no centro do Rio. O Edise, como é conhecido o edifício, era um marco da arquitetura brasileira e espelhava, à época, um conceito de estabilidade e competência de uma empresa que até então era o desejo de consumo daquele jovem engenheiro que participava do certame licitatório. A cena daquele edifício, com seus belos jardins internos, nunca saiu da minha lembrança assim como as ondas do calçadão de Copacabana e o Cristo redentor visto da janela do avião.

 

Por esses dias estava assistindo o filme “Getúlio” do diretor João Jardim, e não obstante a minha grande admiração pela figura histórica do caudilho, chamou-me atenção o seu início quando o então Presidente eleito narra brevemente sua histórica política e seus feitos. Entre outros, que não são poucos, ele cita a criação da então Petróleo Brasileiro S/A, a Petrobras. Na hora me veio à mente a imagem do edifício sede no centro do Rio e confesso que emocionei com a lembrança. Não sei se bem pela imponência que havia causado em um engenheiro recém-egresso da faculdade ou pela carga dramática de um filme que retratava principalmente a crise de consciência de um Presidente que culminou no ato cabal de seu suicídio, ou ainda um misto dos dois. O fato é que os momentos foram se ligando e culminaram na atualidade onde a empresa passa por uma crise de identidade sem precedentes em sua história. Fiquei imaginando o que diria Getúlio Vargas vendo o que foi o maior orgulho dos brasileiros se transformar na maior chacota da era republicana. Com certeza laçaria mão de sua pistola de cabeceira e novamente alvejaria seu coração para se livrar da vergonha. Palavra, essa vergonha, que falta aos homens públicos de hoje. Obstante o vilipêndio vexatório, a Petrobras sobreviverá. Creio nisso. O que não sobreviveu foi o ideal inocente daquele engenheiro recém-formado, que por muito tempo coincidiu com o sentimento da maioria dos brasileiros de acreditar que o petróleo era nosso. Nosso quem cara pálida?              

 

      

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 14/11/14

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

vende-se fusca 87


Vende-se fusca 87

           

 
            A notícia de destaque da semana foi a suposta oferta de um milhão de dólares proposta por um suposto Xeque árabe para arrematar um fusca 87. Mas não é um fusca qualquer. Trata-se do veículo pertencente ao caricato Presidente do Uruguai José Mujica. Temos nos deparado, desde que assumiu a Presidência, com um desfile de situações inusitadas proporcionadas por Mujica, sendo a mais emblemática delas o meio de condução do mesmo. Enquanto a grande maioria dos chefes de Estado utiliza todo um staff de proteção para sua locomoção, Mujica, ao contrário, se utiliza de veículo próprio, dito um fusca azul celeste ano 87, sem nenhum segurança a tira colo. Chega a ser engraçada a situação. Fora a parte curiosa do fato e do comportamento simplório do Presidente, o Uruguai sempre esteve nas telas mundiais como um país inovador e precursor de medidas relacionadas a direitos civis e democratização da sociedade. Entre outros feitos, foi o primeiro país a legalizar o divórcio, segundo país americano a conceder direito de voto as mulheres, primeiro país sul americano a legalizar a união entre pessoas do mesmo sexo e recentemente o primeiro país a legalizar o cultivo, a venda e o consumo da cannabis, vulgarmente conhecida como maconha. Faz parte da sua História esse movimento social colocando o país como uma das democracias mais estáveis do globo. E aí para colocar o laço de fita no presente, a cereja no bolo, somos presenteados com essa figura pitoresca e lendária que é o atual Presidente. E se não bastasse a maneira franciscana dos modos do governante, a suposta destinação do recurso oriundo da venda de seu fusca foi cogitado por ele ser aplicada em programa de construção de residência para população de baixa renda de seu país. É ou não um tapa na cara de muitos governantes que veem a política como forma de enriquecimento ou ascensão somente pelo poder? Se eu fosse chefe de Estado nesse momento estaria imensamente envergonhado. Os motivos pelo qual o Xeque árabe fez a proposta não estão em análise nesse momento, apesar de pressupor que seja somente para aparecer, mas o que mais importa nesse momento é a atitude de Mujica em destinar um bem próprio (superestimado temos que admitir) para um programa social dos habitantes que o elegeram. E aí vem o ponto. Elegeram-no exatamente para isso. No mais ele somente cumpre a sua função. Não vamos fazer aqui uma pregação de atitudes franciscanas para todos os políticos do mundo, até porque isso é impossível, mas que sirva de exemplo a essência pregada por Mujica. A responsabilidade para com a coisa pública e o cumprimento da real função de governante e representante do povo.  Independente de tudo isso um aviso importante precisa ser dado. Se realmente o Xeque árabe adquirir o fusquinha, melhor que ele abasteça pelo Uruguai mesmo, porque se atravessar a fronteira do Brasil já vai pegar o aumento dos combustíveis. Aí não sei se ele conseguirá pagar.                  
 


 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 07/11/14