sábado, 27 de dezembro de 2014

O Papa é Pop


O Papa é Pop

 

 

            Inevitável quando se aproxima o fim do ano, são as listas daqueles que se destacaram mais ao longo do mesmo ou os assuntos mais comentados. Ou os dois juntos.  Para não ser diferente da corrente comum vou aqui fazer uso desse artifício, porém não com listas, mas com um eleito só. Sem dúvida nenhuma, para esse que vos escreve, a unanimidade do ano foi o Papa Francisco. Jorge Mário Bergoglio assumiu o papado em março de 2013 em substituição ao taciturno Papa Bento XVI e começou escolhendo um nome bem mais suave e fraternal: Francisco. Quem nessa face da terra já não escutou falar do santo da humildade e dos animais? Já a alcunha Bento não sei dizer nada sobre. E olha que já tivemos 15 antecessores. Outras duas coisas que o tornaram impar foram os ineditismos do primeiro Papa jesuíta e latino americano. Confessamos, nós brasileiros todos, a ponta de decepção pelo fato da escolha ter recaído sobre a Argentina, afinal tínhamos grande chance no certame, mas querer que o Papa e Deus sejam brasileiros é muito egoísmo né não? Pois sei que o homem entrou de sola no cargo. A começar por seu sorriso aberto (bem diferente do Papa Ratzinguer) e suas atitudes franciscanas. Entrou na garagem do Vaticano e colocou a venda os veículos de luxo, mostrando o viés de humildade que norteia sua conduta. Chamou ao diálogo as religiões que vivem se engalfinhando secularmente, mostrando a visão de coexistência pacifica entre os homens. Defendeu os homossexuais e excluídos chamando-os à igreja, colocando o preceito da tolerância e inclusão. Disse até que os cachorros iam para o céu! Pensa bem! Um Papa que no contexto geral parece agradar gregos e troianos. Talvez não se faça tão agradável à parte da Cúria Romana, visto que tem pisado no calo de muitos conservadores da Igreja Católica, mas nem por isso deixa de chamar a atenção das “cabeças coroadas”, como fez essa última semana quando citou as 15 doenças que acometem a direção da igreja. E isso tudo no verbo rasgado. Em latim e demais línguas entendíveis pelos cardeais, bispos e demais membros da igreja. Uma literal lavada de roupa suja em público. Sem papas na língua (perdoem-me o trocadilho infame). Para fechar com chave de ouro o ano papal, por ordem de seu aniversário no dia 17 de dezembro, o Presidente Obama anunciou o reatamento das relações diplomáticas com Cuba e o possível fim do embargo econômico à ilha dos irmãos Castro. Tal atitude foi em grande parte atribuída à intervenção diplomática do Papa Francisco. Sinal de sua capacidade de conciliação e vanguardismo. A única mancha que fica nesse ano de glória de Francisco é a derrota de seu time, o San Lorenzo, na final do campeonato mundial de clubes da FIFA (apesar da vitória inédita da Copa Libertadores da América). Mas também ganhar do Real Madri com essa bola que estão jogando ultimamente é papel para uns três papas e dois santos juntos. De qualquer forma talvez sua intervenção com o Divino tenha feito com que o seu time argentino só perdesse por dois gols. Quase um milagre nas atuais circunstâncias futebolísticas. Agora, para colocarmos o laço de fita no presente, só falta o Pontífice declarar Humberto Gessinger como profeta da Igreja, haja vista sua profecia ter se cumprido. Afinal o Papa é Pop. Literalmente.        

  

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 26 de dezembro de 2014

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

a cerveja da paz


A cerveja da paz

                 

            Essa semana estava eu com queridos amigos degustando algumas cervejas especiais em uma casa especializada no centro da cidade como é de costume no final do ano. Estabelecimento ainda novo com atendimento personalizado, daqueles que o dono vai as mesas fazer as honras da casa. Os garçons muito bem treinados sobre as características da bebida como acidez, toque, fermentação, corpo e outros conceitos que vão se embaralhando no decorrer da degustação. Numa dessas demonstrações, foi levada até a mesa uma cerveja, que eu não conhecia, e entre explicações mil o apresentador falou que era a cerveja preferida do Presidente Barak Obama. Pronto. Lembrei-me que naquele dia coincidentemente, havia sido dado o primeiro passo para a quebra do embargo econômico a Cuba prestado pelos Estados Unidos desde o ano de 1962. Mais de meio século de uma celeuma que marcou a História mundial. Episódios como a Guerra dos Mísseis que quase eclodiu na 3ª Guerra Mundial e a invasão frustrada a Baia dos Porcos permeada por personagens controversos e nada ortodoxos como Fidel Castro, JFK, Che Guevara e Reagan levaram o mundo exaustivas vezes a discutir e refletir sobre quão pode ser danoso a diferença de pensamentos políticos econômicos. Uma nação, no caso cubano, que ficou à margem do desenvolvimento mundial dependendo exclusivamente das migalhas jogadas pela antiga União Soviética sendo utilizada como joguete de uma guerra fria que já teve seu fim decretado há tempos. Uma nação, no caso americano, que foi mostrando cada vez mais seu imperialismo e colhendo ódio e desentendimento de grande parte das nações livres trazendo contra si as sequelas do revanchismo dos mais radicais. Sem fazer juízo de valor de erros e acertos porque em vários pontos do enredo todos estavam errados sempre, vimos uma novela se estender por mais de cinquenta anos e hoje, em pleno século vinte e um, nos parecer filme antigo em preto e branco. Fato consumado. Alguém precisava dar capítulo final a essa história. Coube ao Presidente Obama pelo lado americano e Raul Castro pelo lado cubano o aperto de mão final fechando um ciclo de suas histórias que entendemos não precisar se repetir. Se valer a sugestão para selar esse entendimento sem precedentes, Obama poderia chamar Raul para uma cerveja de sua predileção. Fica a dica. Aquela mesma que me foi oferecida no começo do texto. Eu aceitei o oferecimento e brindei. Não a paz mundial, que é desejo óbvio de miss, mas ao bom senso que entendo existir no interior de cada homem e que deve prevalecer sempre.   

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 19 de dezembro de 2014


 

 

quer conhecer a cerveja preferida do Obama?
 

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

ostra bem


ostra bem

 

            Sabem programa de turismo certo? Aquele que dez entre dez fazem? Pois esse se chama Mercado Municipal de São Paulo. Apesar de muitos não considerarem a cidade um modelo de turismo ideal, vide sua falta de praia e neve, sempre fui fascinado por andar pelas ruas da Paulicéia buscando  peculiaridades e histórias espalhadas pela maior metrópole do país. Nesse contexto a unanimidade é o mercadão. Ponto de encontro dos forasteiros que imergem numa torre de babel de aromas, cores e sabores. Não só nos acepipes comestíveis, mas em sua arquitetura eclética, vitrais coloridos e no burburinho alto dos feirantes. Chega ficar tonto com tamanha efusão e confusão. Nesse instante os que estão lendo devem estar pensando: “daqui a pouco ele vai falar do pastel de bacalhau ou do sanduiche de mortadela do Hocca Bar”. Erraram! Não que não valha destaque. Aliás, pelo contrário. Aos que nunca experimentaram esses dois ícones da gastronomia paulistana, recomendo enormemente. O conselho é que chegue cedo, pois a maioria dos visitantes também são ávidos pela iguaria, o que torna a fila de espera quase interminável em determinados horários. Fora esse circuito clássico do mercadão, basta ficar atento para descobrir inúmeros outros atalhos ao jardim do éden da gastronomia. Quer um exemplo? Na entrada da ala dos pescados logo à direita. Casa das Ostras. Barraquinha de esquina com menos de meia dúzia de mesas altas e banquetas. Alguém em sã consciência não sentaria ali. Mas a questão é que quando se trata de comida, não me considero um cidadão totalmente provido das faculdades mentais. Da última vez que fui estava com a família. Esposa e meus dois filhos pequenos. Pensa em dois meninos no meio do mercado pela primeira vez?! Queria leva-los para conhecer o roteiro clássico, mas as ostras frescas me olharam de uma maneira irresistível. Pensei que uma paradinha para “algumas” ostras não faria mal antes do almoço. Estava lotado. Pensei em desistir devido à falta de mesa. Com criança é mais complicado. A esposa pediu paciência e logo a Santa da Mesa Desocupada nos atendeu com uma no canto e sentamos espremidos em meio aos demais comensais. Pede uma porção de ostras e um chopp. Só para abrir o apetite. Os meninos avistam uma porção de lulas fritas. Certeza. “Papai, eu quero!!”. Pede também. A mesa mal cabe os dois pratos e o chopp. Vamos fazer um aparte para o chopp. Ir à sampa e não tomar uma caneca ou várias no mercado é considerado no manual do gastrônomo amador uma heresia sem perdão. Como não gosto de pecar pedi logo o segundo. Daquele preto com a espuma cremosa. E vai ostra e vai lula e vai chopp. Não nessa mesma ordem. O que devem estar pensando em como ter coragem para comer frutos do mar no meio do mercado de São Paulo vai um ditado antigo que diz sabiamente: “o que não mata engorda”. Só para constar nas minhas estatísticas estomacais, nunca tive nem um revertério comendo no mercadão. Tudo parecia muito bem, mas eis que no meio da refeição, pela proximidade das cadeiras, dois homens que estavam na mesa ao lado puxam assunto e dão uma sugestão: “compre camarão do grande na barraca do lado e peçam para fritar no alho e óleo”. Pronto. Sugestão acatada. Compra um meio quilo daquele camarão de ver Deus (que na sua terra vale 3 dígitos o quilo) e pede a garçonete para preparar. Olha... olha... olha! É de comer ajoelhado. Casou com o chopp e os dois viveram felizes para sempre. No final das contas, o pastel de bacalhau e o sanduiche de mortadela ficam para a próxima feita, em virtude de refestelamento precoce. Você sai de lá rico, bonito e satisfeito. Comida simples, fresca e bem feita. Junta com a presteza do atendimento paulistano e a carga histórica do local e pronto. Se eu fosse jurado da Michelin era estrela na certa.       

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 12 de dezembro de 2014
 
 
abriu o apetite?
 


 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

doença ou cura?


Doença ou cura?

 

            Estava eu, nessa manhã, comprando apressadamente um suco na padaria perto da escola dos meus filhos (porque filho lembra que tem que levar as coisas para escola na última hora) quando, no caixa, vi fixado um cartaz com os dizeres: “contrata-se atendente – salário + vale transporte + vale alimentação – tratar aqui”. Parece um cartaz normal não é? Mas não é. A letra que oferece o vale alimentação está o dobro do tamanho da letra que oferece o salario e o vale transporte. Por quê? Um turbilhão de reflexões me veio à mente. Vale uma crônica. Ô se vale.

            Nunca antes na História desse país se discutiu tanto sobre programas sociais. As chamadas bolsas assistencialistas encontram defensores árduos e críticos vorazes, além de uma massa que é beneficiada e logicamente aquiesce do fato. Esse Estado paternalista foi institucionalizado por Getúlio Vargas em meados de 1900 que consolidou as leis trabalhistas através do decreto lei 5.452 de 01/05/1943 que garantiu direitos básicos dos trabalhadores. Como um processo de evolução, esse modelo migrou para os benefícios assistencialistas, como alimentação, escola, gás entre outros, sendo muito explorados politicamente pelos partidos que implantaram ou se apropriaram desse viés. Em virtude disso, houve uma institucionalização das bolsas, bastante percebido nas eleições de 2014, onde quem não se alinhou a continuidade dos benefícios perdeu pontos e principalmente votos. Resumindo, as bolsas assistencialistas se incorporaram extra oficialmente a CLT. São direitos incontestes dos trabalhadores e não trabalhadores. Os defensores do modelo pregam que existe uma próxima fase, que seria a qualificação do cidadão beneficiado para que ele possa se despregar da bolsa e consiga caminhar pelas próprias pernas. Seria o famoso “não dar o peixe, mas ensinar a pescar”. Ainda nessa linha os defensores argumentam que “ensinar a pescar” um cidadão que passa fome e privações básicas, não resolveria o problema, e por isso, necessitaria de um estágio anterior justificando o benefício das bolsas. Os críticos defendem a ideia que não passa de uma ação politiqueira que utiliza da máxima do estado romano do “pão e circo” para alienar a população e transformá-la cada vez mais em massa de manobra. Além disso, criticam a falta de evolução para a próxima fase de descolamento colocando dúvidas se realmente os assistencialistas querem essa evolução ou simplesmente almejam manter a população sob sua asa paternalista. Coisa que também não seria novidade, já que o então “pai dos pobres” Getúlio, já fazia isso desde o começo do século XX.

            Qual a minha opinião? Posso exprimir em uma palavra. Decepção. Isso me acomete quando vejo um cartaz de oferta de emprego que tem como principal atrativo o assistencialismo. Salário, vale transporte, vale alimentação, plano de saúde, plano odontológico, etc. Sou de uma geração que acredita na capacidade produtiva. Na remuneração por esforço e meta. Não quer dizer que não defenda com unhas e dentes benefícios para meus funcionários. Pelo contrário. Mas entendo que deve fazer parte do processo de remuneração. Tudo conversado previamente e acordado. Aquilo que é dado de graça sem anteceder o esforço e a dedicação se esvai depressa ou pouca valoração tem para quem recebe. Um trabalhador motivado que vista a camisa da empresa e cumpra suas metas deve ser bem remunerado através de seu esforço e de programas de distribuição de lucros das empresas. Assim ele poderá por seu mérito crescer e dirigir sua própria carreira sem necessitar de assistencialismo. A maioria dos empresários e trabalhadores pensa assim? Com certeza não. Utópico? Prefiro pensar que seja um objetivo de longo prazo. Melhor seguir assim do que andar pelo caminho que estamos trilhando, onde não temos certeza se estamos caminhando para a cura ou para a doença. Pensemos.      

 

# crônica dedicada ao amigo Jones

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 05 de dezembro de 2014