Motivo
para protesto não falta
Quase
todas as manhãs levo minha filha de onze anos à escola. De carona vai um colega
e amigo na mesma idade. Pelo caminho muitas vezes vamos calados pelo sono de
ambos ou batendo papo quando estão mais despertos. Hoje foi dia de conversa
profunda. Protestos e greve geral. Suscitado pelo rádio que vai ligado e gritando
as notícias do dia. Logo quiseram saber a motivação dos movimentos que se
iniciaram nessa manhã de sexta. Como é do meu feitio não ser raso nas explicações,
comecei nos meados da revolução francesa. Mas não pensem naquela história
enfadonha e chata. Ao longo da retórica sempre incluo uns fatos marcantes para
dar cara de filme de suspense, tipo a decapitação do rei francês e sua esposa,
ou o fuzilamento do czar e sua família quando da revolução russa de 1917.
Isso posto, passei pela
revolução industrial na Inglaterra e a exploração do trabalho humano, perpassei
pelo governo Vargas e a promulgação das atuais leis trabalhistas, encaminhei-me
pela ditadura militar e a proibição de manifestações populares, citei a
redemocratização, eleição e impeachment de Collor (nessa parte frisei orgulhoso
que, de rosto pintado de verde amarelo, tinha ido às ruas engrossar o coro dos “insatisfeitos”),
cheguei à era Lula e o fortalecimento dos movimentos sindicais e finalizei no
atual e fragilizado governo com as tão polêmicas reformas estruturantes.
Nesse ponto me ative em
explicar a motivação do movimento proposto para hoje que seriam as reformas
trabalhistas e previdenciária entre outros. Falei sobre cálculo atuarial,
contribuição previdenciária, conquistas de direitos trabalhistas, longevidade
da população brasileira e por fim, como numa conclusão histórica, refleti sobre
o direito de protesto e de luta pelos direitos individuais e coletivos. Isso sem
deixar de frisar, bem frisado, a minha opinião pela manifestação pacífica e
ordeira.
Diante de toda essa miscelânea,
notei-os um pouco atordoados com o excesso de informação, então perguntei se
haviam compreendido. Eles responderam que era um assunto complexo mas que
tinham captado grande parte da explicação. E de bate pronto um deles soltou a
pérola: “se o protesto for contra a professora de geografia eu estou dentro”. O
outro imediatamente manifestou apoio à causa e formou-se, ali naquele carro, um
movimento grevista. Cada um com seu pleito.
Guilherme
Augusto Santana
Goiânia, sexta feira 28 de abril de 2017