sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

para o alto e avante

somente reflexões de um pai a espera da entrega do boletim dos filhos.




Para o alto e avante

 

            Chega o final de ano e com ele alguns eventos endêmicos. Daqueles que acontecem preferencialmente no mês de dezembro. Tipo confraternização, amigo secreto, show do Roberto Carlos e entrega de boletim de menino. Posso dissertar sobre os quatro temas com a maior facilidade, mas nenhum me provoca mais reflexão do que o último. Apesar de que o show do Rei sempre provoca muita reflexão. Mas, voltando ao assunto, estava eu hoje, junto com uma centena de pais, recebendo as notas de fim de ano dos filhos. É nesse momento que a porca torce o rabo. Culmina todo um ano de trabalho pedagógico. Desnudam-se as capacidades e deficiências desses pequenos seres, que aos olhos dos pais parecem perfeitos. Tá não exageremos... têm algumas deficiências, mas só nós podemos aponta-las. Como alguém se atreve a fazê-lo?! Respira. É nesse momento de reflexão, sentado aguardando ser chamado para falar com a professora, ou mesmo sentado diante dela, que divaguei. O que é educar um filho. Quais as responsabilidades de um ser imperfeito, no caso eu, em educar outro ser. O quanto da felicidade daquele pequeno ser depende desse ser que vos fala. O quanto do sucesso dele depende do que eu puder transmitir. O quanto eu só queria que eles fossem felizes. O quanto eu queria que tivesse um comprimido da boa educação (quem inventar fica rico). Há quem diga que educar filhos atualmente é mais complexo. Que o mundo é mais complexo. Que os perigos são maiores. Não sei se devo concordar. Seria como afirmar que Pelé foi o melhor jogador de todos os tempos sem vê-lo jogar no nosso tempo. Será que ele hoje, faria o mesmo sucesso? Penso que a análise não pode ir por esse caminho. Cada época tem sua complexidade e o homem evolui conforme a necessidade. Partindo desse princípio penso que meus avós foram criados com tanta complexidade quanto eu fui criado e meus filhos estão sendo. Se hoje nós temos a internet a atormentar a cabeça dos pais, outrora tivemos a ideologia política, o movimento hippie, os cabeludos Beatles, as grandes guerras e Caim. Há outros ainda que digam o contrario. Criar filhos nos tempos atuais é muito mais simples. Jogam grande facilidade na tecnologia e no conhecimento avançado. Mas esquecem-se esses, que assim como os pais tem acesso à informação, os filhos também o têm. Então continuamos empatados. Alias, os educadores tem que correr muito mais para não ficar para trás diante da fome de conhecimento desses meninos. Crianças que hoje são educadas e no futuro educarão. Terão também essa missão árdua e ao mesmo tempo gratificante. Quais serão as dificuldades pelas quais eles passarão quando chegar seu tempo? Só o tempo dirá. Hoje de manhã, na entrega dos boletins, recebi mais notícias boas do que ruins. Isso mostra que o caminho é árduo mas parece certo. Como recompensa sairei mais cedo do trabalho e assistirei a um filme com eles. Com direito a pipoca e refrigerante. Qual o filme escolhido? Levarei a primeira versão de Superman de 1978. Por incrível que pareça eles gostam de filmes da época de seus pais. E eu gosto de ver as carinhas deles achando tudo engraçado. Porque os tempos podem ser distintos, mas o afeto os une.

 

 
 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 13/12/13

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Ser ou aparecer? Eis a questão

passando pelo mundo virtual uma notícia chamou-me a atenção. Não pude deixar de escrever sobre.


Ser ou aparecer? Eis a questão

 

 

            Senta que lá vem história.

 

            Era uma vez um garoto de classe média nascido no estado de Ontário no longínquo Canadá. Os pais, precocemente, notaram no pequeno menino uma aptidão musical. Aos três anos já dominava a bateria e aos seis, o violão. Tudo girando ali no círculo familiar, pois a mãe, cristã fervorosa, tinha medo de incentivar a veia artística do filho temendo os vícios e perdições do meio artístico. Melhor seria tocar na igreja. Mais seguro. Fora alguns concursos locais de talentos, o garoto seguia sua vida corriqueira canadense. Quando tinha por volta de treze anos, sua mãe resolveu gravar suas atuações na voz e violão e postar no YouTube, visando que seus parentes próximos escutassem o jovem mancebo. Assim feito e assim postado. Foi aí que um fenômeno começou a mudar a vida do jovem pré-adolescente. A internet. Pessoas do mundo todo começaram a acessar os vídeos. Mamãe já estava preocupada, mas continuou com as postagens. Foi então que, por acaso, um empresário do mundo da música se deparou com um dos vídeos. Encantou-se. Procurou o jovem talento e com ele celebrou um contrato. Sua fama se espalhava. Viral. Contratos milionários e contatos com famosos. Todos queriam conhecer o fenômeno. Tudo muito rápido. Foi indicado a vários prêmios musicais e sua fortuna pessoal não parava de crescer. Tudo na mesma proporção que seus vídeos foram assistidos no YouTube. Como um rastilho de pólvora. Diziam alguns meios de comunicação que sua influência nas redes sociais era maior que a do Presidente dos Estados Unidos e do Dalai Lama. Tinha um séquito de milhares e milhares de fãs ardorosas e sedentas por qualquer coisa que se referisse a sua figura. Brigavam, batiam e matavam por ele. Não desmerecendo seu talento musical (nem merecendo), mas tudo imensamente impulsionado pela internet. O catalisador que pode potencializar.

 

            Era uma vez o mesmo cantor. Rico e famoso. Fenômeno de popularidade na internet. Resolveu fazer uma turnê em um país latino. Foi recepcionado pelo orbe de fãs enlouquecidos. Todas o queriam. Todos o queriam. Mas como a maioria dos adolescentes resolveu se divertir um pouco. Afinal essa vida de pop star cansa de vez em quando. Acometido de um senso de imputabilidade comum às celebridades, resolveu pichar um muro em zona nobre da cidade onde fazia show. Olha a ideia de jerico. Foi flagrado pelas câmaras de um fotógrafo que talvez tenha feito a vida somente com essa foto. Num átimo de segundo a notícia se espalhou pela internet. Viral. Uns acharam um absurdo. Outros acharam divertido. Outros acharam fantástico. Todos acharam alguma coisa. Comentários pipocaram nas redes sociais. Trend Topics. Não satisfeito, o pop star foi flagrado saindo de uma “casa de massagem” com duas “amigas”. Não sei se o mesmo fotógrafo, mas também irrelevante o fato. Fotos e vídeos pipocaram novamente pela internet. Mais uma vez o cantor tornou-se pivô dos comentários do mundo virtual. Bateram recordes e recordes de acesso as notícias bombásticas. Assim como a vendagem de seus discos. Tudo numa proporção geométrica até que surgisse outro viral que iria desbancar seu trono. Até que surgisse outro artista coletado nas vias do YouTube ou Face book ou Twitter ou Istagram ou qualquer coisa que venha sucedê-los. E quem sabe, um dia, o jovem fenômeno voltasse ao Canadá ou acabasse sua vida afundado nas drogas e na ilusão de retorno da fama outrora conquistada. Tudo culpa da internet. O vírus que pode destruir.

 

Era uma vez a mãe de um menino. Que pensava em criar seu filho como toda boa mãe cristã. Ama-lo, protege-lo e educa-lo. Mas a criança conheceu o mundo virtual. Foi amor à primeira vista. E ele sucumbiu. E ela perdeu. Nesse momento não consigo deixar de me colocar no seu lugar. Pai. Guardadas as devidas proporções. Travando dia a dia uma luta insana contra a internet. O catalisador que pode potencializar. O vírus que pode destruir.

 

(qualquer semelhança com fatos reais é mera coincidência. Ou não)          

                       

 

 

 Texto produzido para a Revista Foccus

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta, 08 de novembro de 2013

sábado, 2 de novembro de 2013

e por falar em saudade...

Shakespeare disse uma vez:
"Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente."



AMOR INCONDICIONAL

 

 

Ontem quando cheguei em casa senti uma vontade imensa de abraçar minha filha. Parecia uma desejo vindo de dentro, como um alento para meu coração apertado. Quando ela me viu, correu com um sorriso no rosto e me abraçou como se a saudade não coubesse mais dentro de seu coraçãozinho. Eu a abracei e fiquei por um instante com a sensação de que aquele momento poderia se eternizar e nunca mais me separaria dela. Se pudesse fazer um pedido a Deus naquele momento, mesmo que fosse um pedido insano, ele seria para que um pai nunca precisasse enterrar seu filho. Mas como Deus não me permite pedidos insanos, pedi a Ele então, um alento para os pais que acabavam de enterrar o seu, apesar também de saber que esse pedido dificilmente iria ser atendido.

 

Ontem quando vi as lágrimas correrem nos olhos de muitos, quando vi a consternação estampada no rosto de todos ao verem um pai e uma mãe conversarem com seu filho como se ele ainda estivesse vivo, lembrando a si mesmos quantos momentos bons haviam passado juntos, me lembrei que fazia muito tempo que não abraçava os meus pais. Que fazia muito tempo que não dizia a eles o quanto os amava. E me lembrei que eu ainda tinha essa oportunidade diferente do filho que jazia imóvel diante das lágrimas dos seus.

 

Ontem quando fui dormir, não conseguia tirar de meu pensamento o quarto vazio que havia deixado aquele filho. Derramei mais uma lágrima imaginando a dor de seus pais ao entrarem naquele quarto e não encontrarem mais seu filho. Somente objetos. Somente lembranças. O quarto de minha filha também estava vazio aquela noite. Ela estava dormindo comigo. Nem que fosse por aquela noite. Eu podia sentir seu calor e sua respiração tranquila. Olhei para ela e segurei sua mão com força como numa tentativa insana de acalentar dois corações distantes que não tinham mais aquela aportunidade.

 

 

* em memória de Tiago de Melo.

 

Guilherme Augusto Santana


Goiânia, 17/03/2008

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

ah a danada da saudade...

Sempre quando vai chegando a data de finados  se aproxima a danada da saudade. São pessoas especiais que fazem falta na vida de todos nós. Quem não tem uma avó como a Ná (que apresentarei p/ quem não conhece) em sua vida e se recorda sempre com uma sensação boa? Com a permissão do leitor postarei uma crônica escrita em 2006 por conta do falecimento da minha avó. Ao lerem pensem nos seus entes queridos que deixaram saudades.




 

 

         Quem não conheceu a Ná não sabe o que é biscoito de queijo quente servido a qualquer hora do dia ou da noite. Podia estar entupido de comida que se não se servisse de pelo menos um, era desfeita. Mal entrava e já escutava: vou “quentar” uns biscoitos, antes mesmo do “bença” e do “Deus te abençoe”. Por isso que a mesa tinha que ser grande: em um canto a canastra e em outro, sempre a postos, o lanche da Ná. Quem não conheceu a Ná não sabe o que é o autêntico frango com quiabo e angu lá do interior de Minas. Servido com jogos de mesa completamente descombinantes: talheres de um jogo, pratos diferentes. Nenhuma peça igual à outra. Deve ser fruto dos seus muitos anos de casamento e da mania adquirida do Agenor de não jogar nada fora. Quem não conheceu a Ná não sabe o que é rezar o terço à maneira dos Santana: O Moreno disparado na frente e a Natália tentando diminuir a marcha. Logicamente que entre uma Ave Maria e um Pai Nosso faziam o planejamento do dia em voz alta e tinham as pequenas discussões sobre dinheiro. Nunca entendi como eles não se perdiam no meio do terço. Anos de prática.

        

Mas, quem conheceu a Ná, saiu muitas vezes de sua casa cheio de pacotes de bolacha ou uma lata de doce em calda que fazia parte da sua dispensa. Mas escutou muitas vezes também o Agenor gritar de lá que não ia mais dar dinheiro p/ fazer supermercado porque ela dava tudo para os outros. E ela se intimidava? Que nada. Falava: “esconde este pacote de bolacha que depois eu tiro dinheiro da carteira dele e compro mais”. Mesmo que não gostasse da bolacha era ótimo presenciar esta cena. Quem conheceu a Ná sabe que não se podia falar mal de nenhum filho dela, nem mesmo de brincadeira. Partia logo em defesa, mesmo sabendo que o acusado tivesse aquele defeito. Às vezes fazia só para ver a reação dela. Parecia uma leoa em defesa dos filhotes.

        

Agora, quem gostava da Ná, sabe que a data do Natal a partir de agora perde um pouco o seu brilho, porque há seis anos perdemos o Capitão e agora perdemos a motivação para seguir navegando. Sabe que agora só restam saudades mesmo. Sabe que o presépio, os presentes, as músicas, o parabéns não mais voltarão a acontecer, só nas nossas recordações. Quem gostava da Ná sabe que vai ficar um vazio, uma cadeira vazia, um quê de não me deixe, uma sensação de que a vida não será mais a mesma sem ela. Mas sabe também que ela deixou uma semente, aliás, deixou uma plantação inteira de amor, dedicação, carinho e fé. E isso é o que fica.

        

Oh Moreno ! Arruma o canto da mesa aí, que o biscoito quente e o café estão subindo.

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 23/02/2006

 

* Crônica escrita em memória de Natália Barbosa Reis, minha avó.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

pai de quem?


Pai de quem?

 

 

            Senta que lá vem história.

 

            Era uma vez dois pais. Ambos zelosos por suas crias. Ao menos era assim que se achavam ser. Papai Tio Sam e papai Tupiniquim. Separados historicamente e geograficamente. Contemporâneos, porém distintos. Um rico e próspero. Ou outro tentando ser. Sempre tentando ser. Papai Tio Sam protegia seus filhos com unhas e dentes. Papai Tupiniquim criava os seus soltos no quintal. Papai Tio Sam criava briga direto para defender a “honra” dos seus. Invadiu papai Iraque, papai Afeganistão e ameaçou papai Sírio. Às vezes ele acha que é pai de todos. Carrega nas costas a “responsabilidade” de defender o mundo. Muitos maldosamente dizem que Papai Tio Sam arruma encrenca pelo menos uma vez por década para alimentar seus filhos da indústria bélica. Prefiro não acreditar nisso. Prefiro pensar que é zelo. Liberdade de seus filhos empunharem armas para se defenderem e defenderem o planeta. Papai Tupiniquim não. Esse é tranquilo. Fez uma consulta popular sobre desarmamento. No final das contas quem era para ganhar acabou perdendo e quem era para perder acabou ganhando e até hoje ninguém sabe quem perdeu e quem ganhou. Um verdadeiro samba do crioulo doido. Alias como tudo que se refere a papai Tupiniquim. Mas o que importa é que seus filhos são alegres. Isso é essencial. Já os filhos de papai Tio Sam... não posso dizer o mesmo. Vivem taciturnos. Fingindo uma satisfação que não parece real. Talvez porque sejam muito visados. Invejados. Por isso papai Tio Sam espiona todos aqueles que podem fazer mal a seus filhos. E espiona também os que aparentemente são inofensivos, como o papai Tupiniquim. Vai que né? E quando papai Tio Sam é descoberto fazendo coisa errada, nem se digna a pedir desculpas ou sentir remorso. Mas ele não gosta de ser espionado. Ai, ai, ai! Fica nervoso. Briga. Ele não gosta de filhos dedo-duro. Apela para o quesito segurança nacional. Afinal faz isso tudo em prol da felicidade de seus filhos. É zelo. Já papai Tupiniquim não. Vive bajulando seus vizinhos fanfarrões. Papai Chavista, papai Castrista e papai Bolívia. Coisas de ideologias passadas. Fica todo envergonhado quando comete um deslize. Filho de Bolívia esses dias ficou mais de ano na casa de papai Tupiniquim. Todas as conversas forma executadas para que papai Bolívia autorizasse a saída de seu filho rebelde. Nada. Aí num lampejo hollywoodiano, filho de papai Tupiniquim evade com o cidadão para acabar com a prosopopeia. O que papai Tupiniquim faz? Fica envergonhado e pede desculpas. Puni seu filho teimoso. É assim que papai Tupiniquim faz. Papai Tio Sam não pede desculpas nunca. Papai Tupiniquim pede desculpas sempre. Até quando não é necessário. Síndrome de vira lata. Papai Tio Sam ajuda sempre seus filhos. Protecionismo no mercado permite que seus produtos, mesmo com custos mais elevados, sejam vendidos. Papai Tupiniquim também. Dá bolsa para tudo. Sustenta seus filhos que estão passando fome. Sustenta também parte dos que não estão passando fome. É porque papai Tupiniquim é meio desorganizado sabe? Papai Tio Sam gosta das coisas bem certas. Republicanos e Democratas. Vermelho e Azul. Elefante e burro. Não gosta de bagunça na hora de decidir os rumos da casa. Papai Tupiniquim não. Gosta de fartura. Um sem número de partidos. Decisões que não se firmam. Indecisões que se perpetuam. Tudo em prol da felicidade de seus filhos. Aliás, os dois pais. Ambos só querem ver sua prole bem nutrida e feliz. Assim também é minha intenção. Papai Guilherme. Ver meus filhos felizes e bem educados. As definições dependem do ponto de vista de quem olha. Paternalismo, zelo, desleixo, liberdade, protecionismo, proteção. São palavras que fazem parte da vida de quem tem por missão educar filhos. Mas uma palavra eu tento introduzir sempre nesse meio. Equilíbrio. Penso que essa seja a lição de moral da história. Nem tão a papai Tio Sam e nem tão a papai Tupiniquim.  

 

                       

 

 

 (Texto produzido para a Revista Foccus)

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta, 06 de setembro de 2013

sábado, 20 de julho de 2013

uma história sobre almas boas

segue uma homenagem a quem merece
 
 
Uma história sobre almas boas

 

 

            Essa é uma história sobre almas boas. Ela começa parecida com todas as outras. Era uma vez uma família que estava de férias e pegou a estrada rumo ao descanso merecido. Eles iam acampar. Lonjura só de estrada. Pra mais de mil quilômetros de distância. Percorridos em duas etapas. Dormir no caminho para não cansar as crianças. Quando o pai vê a quantidade de bagagem já pensa logo: “não vai caber no carro”. Respira fundo e começa a arrumar a tralha. Vai enfiando tudo nos buracos que vão se acabando. Parece carro de feirante. Capaz de ter que deixar um dos meninos pra caber. Depois de um quase milagre todos estão no carro. Meninos, bagagem, travesseiros e alegria. Inicia a viagem. A primeira etapa é curta. Para em hotel fazenda achado na internet. Uma formosura. Descanso do corpo cansado para seguir viagem no outro dia de madrugada. O galo ainda não cantou quando é fé, todos na estrada de novo. O orvalho frio da manhã embala o carro de feirante. Meninos perdidos no meio dos travesseiros. Melhor render na estrada antes que alguém jogue pedra no ninho dos caminhões. Estrada federal. Anos a promessa de duplicação. Nada. Mas para a família que saia de férias isso era o que menos importava. Seguia num misto de dorme um pouquinho, ipad um pouquinho, livro um pouquinho, música um pouquinho. O motorista não. Só na direção. Costurando caminhões como se fosse um alfaiate. Estrada ruim. Asfalto ruim. Cada caminhão trazia uma carga. Uma história. Vai o motorista em seu intrépido carro de feirante. Tralha pra todo lado. Eis que numa subida o ponto do alfaiate desanda. Um minuto de besteira e o choque inevitável com a traseira de um caminhão. Pesado caminhão. Pra mais de 20 toneladas. Os segundos pareceram minutos. Entre gritos e choros o barulho do susto. Os meninos entre os travesseiros. O carro no meio da estrada. Tenta ligar. Nada. Num reflexo solta o veículo e ele se move lentamente para o acostamento. Choro incontido dos meninos. Pergunta se tudo está bem. O mais novo parece machucado. Tira o cinto de segurança e o acomoda no colo da mãe. Mãe que parece anestesiada. Filho chorando no colo. Pensamentos mil passam na cabeça. E as férias? O motorista do caminhão que acompanhava tudo desce e caminha em direção ao carro. Foi ver como estavam todos. Todos parecem atordoados. O pai sai do carro e se aproxima do local da colisão. Parece procurar uma explicação. Não tem. Foi o ponto do alfaiate que saiu fora do lugar. Espetou-lhe o dedo a agulha. Volta em direção ao veículo. Percebe as labaredas no meio do ferro retorcido. Corre a tirar as crianças de dentro do carro: “está pegando fogo!”. O choro que havia acalmado volta com toda a intensidade. Pega um menino joga na mão do caminhoneiro. Pega o outro coloca no capim a beira do acostamento. Ela está sem sapatos. É mês de seca. O sol está escaldante. A humidade baixa. Pega o extintor. Descarrega no fogo. Apaga. O acampamento também começa a se apagar. O telefone começa a pipocar. Família de longe querendo saber notícia. Começa a via sacra do seguro. Precavido o seguro. Explicar para alguém que está em outro Estado a localização. Os nomes não são familiares a quem está a mais de três mil quilômetros de distância. As crianças ainda choram. O motorista do caminhão olha tudo. Propõe levar todos para a cidade mais próxima. Coisa de uma centena de quilômetros. Diante do sol, humidade, choro e decepção se aceita o convite. Todos para a boleia do caminhão. Os meninos nunca andaram no caminhão. Emoção diferente. Não demora muito eles adormecem. Parece que dormem o sono dos justos. O sangue esfria. A mente trabalha. As dores aparecem. As cenas voltam. O caminhão lento. O motorista parece sensibilizado. Conta que está num percurso de quase quatro mil quilômetros com uma carga. Conta um pouco da sua história. Parece uma alma boa. Preocupado com as crianças. Vai no seu caminhão devagar. Tentando chegar. Para depois voltar. E chegar. E segue a vida. Interminável caminho. Chegam à cidade. No caminho o celular resolveu o problema. Já havia gente esperando na parada. As crianças queriam que o caminhoneiro almoçasse com elas. Queriam retribuir de alguma forma. Ele declinou do convite. Precisava seguir viagem. Seguir por onde a estrada o levasse. As crianças insistiram, mas ele se foi. Parecia preocupado. Parecia consternado. As crianças não conseguiram almoçar. Não nesse dia. Resolvidos os problemas burocráticos, a família superou seus traumas de férias. Fora as dores do impacto restaram lembranças e lições. No dia seguinte estava o carro em cima do guincho quando o celular tocou. Código de área estranho. Era o motorista do caminhão. Estava mais de mil quilômetros à frente. Seguindo com sua carga. Queria saber como estavam as crianças. Como estava a família. Não perguntou pelo carro. O sinal estava ruim. A ligação caiu. Caiu antes que o pai pudesse agradecer mais uma vez. Apesar de saber que os agradecimentos ali eram desnecessários. Implícitos.  Porque ele sabia que aquela história era sobre o encontro de almas boas. Porque elas se encontram. Onde quer que estejam. É a Lei da Correspondência.

 

* em homenagem ao caminhoneiro Flávio que segue sua história de alma boa.

                     

 


Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sábado 20 de julho de 2013

sexta-feira, 14 de junho de 2013

o furo no barco

Eike Batista e o furo no barco



O furo do barco

 

            Tenho acompanhado com certo receio as últimas notícias sobre os negócios do empresário Eike Batista. Não por investir em ações das famosas empresas “X” e muito menos ainda por parentesco ou simpatia pessoal pelo mesmo. O que me preocupa é um sentimento de satisfação de algumas pessoas pelo tremor nas estruturas de negócio do cidadão. Parece assim que estão torcendo para dar errado. O que tenho escutado são comentários do tipo “coitado, caiu na lista dos mais ricos do mundo” (em tom de deboche), ou “bem feito” (em tom mais direto), ou ainda “tomara que quebre” (em tom de praga mais que direta). Isso me preocupa. Não os negócios de Eike, que a meu ver sofrem oscilações normais de mercado, mas essa cultura que paira sobre o povo brasileiro. Muitos podem achar que exagero na análise, mas façamos um teste. Pense em um empresário bem sucedido. Vamos lá não é difícil. Jorge Gerdau, Norberto Odebrecht, Abílio Diniz, Antônio Ermírio de Moraes são alguns exemplos. Qual o primeiro pensamento que vem a mente quando cito umas dessas pessoas. Com certeza rico. Não bem sucedido. Com certeza sorte. Não competência. Com certeza explorador. Não gerador de empregos. Com certeza sonegador. Não pagador de impostos. Com certeza beneficiário das benesses do governo. Nunca carregador da economia. Observaram? Esse é o pensamento geral. E olha que estamos falando dos maiores empresários do país. Se você que está me lendo agora é um empresário, deve ser vítima dos mesmos pensamentos. Vindo de muitos dos seus funcionários, vizinhos e amigos. Porque carregamos a pecha de ladrões e exploradores de mão de obra. Não entendo bem se esse comportamento advém da apatia cultural herdada no nosso processo de formação como povo ou se advém desse falso conceito de socialismo nos apresentado pós século XX. Só sei que é um conceito errado. Eu pelo menos acho. Num país onde precisamos de geradores de emprego, somos incentivados a sermos sustentados pelo Estado. De geradores a consumidores. Uma sociedade voltada para o governo e não para seus próprios cidadãos. Não estou querendo aqui dar um salvo conduto a todos os empreendedores e empresários que temos, afinal em qualquer segmento da sociedade temos joio e trigo. Assim também o temos entre a classe trabalhadora. E nem, de forma alguma, desmerecendo quem optou ou foi optado por ser trabalhador remunerado. Acho que a escolha depende de oportunidades, capacitação e aptidão. Conheço muitos profissionais remunerados na iniciativa privada ou no poder público que são competentes, aptos e felizes com o que fazem. Exercem suas funções. Assim como conheço inúmeros empresários que amam produzir e gerar emprego. E não estamos falando aqui de ganhos financeiros também. Da mesma forma conheço vários trabalhadores assalariados que ganham mais que muitos empresários. Mas não se tratando de importância e nem de remuneração, do que tratamos então? Tratamos de uma noção retrógrada de que a classe empresarial está lá por motivos vis. Por motivos alheios a sua capacidade e competência. Até sorte imputam a eles. Preferem que venham se juntar a mediocridade do que despontar e crescer. Isso me preocupa. Um país que não valoriza seus empresários acaba matando sua economia de inanição. E no final das contas estamos todos no mesmo barco. Não adianta cruzarmos os braços e criticarmos quando o furo é do outro lado da embarcação, porque uma hora a água vai chegar a nossos pés. E assim sendo, vamos todos afundar. Eu sinceramente espero que Eike passe por essas turbulências e retome o caminho que foi traçado por sua capacidade empreendedora. Assim como desejo a todos os empresários que queiram se embrenhar por essas duras paragens. Porque com o crescimento empresarial, cresce o país, cresce a renda, cresce o emprego e crescemos todos nós.     

 

 

* uma singela homenagem a todos os amigos empresários, que assim como eu, seguem firmes e fortes nessa dura missão.

 
Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 14 de junho de 2013

sexta-feira, 7 de junho de 2013

e viva Uruguay!

uma viagem, alguns amigos e muitas histórias


E viva Uruguay!

 

Os leitores que me acompanham de mais tempo, já devem ter lido minhas crônicas sobre viagens e aventuras eno gastronômicas. Isso não é à toa. Faço-as para, quem sabe um dia, ser descoberto por uma grande revista de turismo que me pague para viajar, escrever, comer e beber. Não necessariamente nessa mesma ordem. Aí romperei os grilões que me prendem a esse ofício de enterrar pessoas (brincadeirinha. Gosto muito do ofício de coveiro). Mas o motivo dessa crônica de hoje já está no título. Nosso vizinho menor (em extensão) o Uruguai. Com “y” ou sem, conforme a sua vontade e idioma. Estive pela primeira vez no país semanas atrás. Uma gracinha. Diria que um bibelô. Embarquei no imponente aeroporto Santa Genoveva (para quem o conhece sabe que é uma crítica) e logo na fila do embarque encontramos dois casais de amigos que também seguiam o mesmo destino (aliás, já é de tempo que nós brasileiros dominamos o turismo no cone sul. Os goianos então...). Descendo no aeroporto de Carrasco, vi uma construção antiga e pequena com os dizeres de aeroporto e comentei com minha esposa: “olha aí o povo reclamando do aeroporto de Goiânia e o de Montevideo é pior ainda!”. O avião foi se afastando do prédio antigo e percebi que havia me enganado. Maldita língua grande. Eis que surge o verdadeiro Aeroporto de Carrasco. Belo e imponente. Uma obra de arquitetura como nunca vi em aeroporto nenhum pelo mundo. Depois fiquei sabendo, por um amigo que mora no país, que sua arquitetura é ganhadora de vários prêmios internacionais de design e arquitetura. Justo. Muito justo.

 

Aeroporto de Carrasco

 

            Descido do avião e recolhido as bagagens (levei bronca porque esqueci de trancar a mala da esposa. Como se cadeado inibisse furto em mala nos aeroportos), alugamos um carro para cumprir as distancias pretendidas. Vai ai uma dica para Montevideo. Tudo é muito longe. A cidade é espalhada pela orla do Rio da Prata e o carro economiza muito nos deslocamentos. Além de proporcionar uma liberdade diferenciada. Primeira sorte da viagem. Ganhamos up grade no carro! Coisa rara ganhar coisas em viagens. Geralmente perdemos coisas. Mas segue o cortejo. Logicamente que o pacote de dados que foi desbloqueado no Brasil não funcionou e a ligação para a operadora de celular foi inevitável. Tenho um problema. Os amigos que me conhecem sabem disso. Não consigo ficar sem internet. Não consigo ficar sem passar vontade nos que ficaram. Mas é um problema menor. Pelo menos eu acho. GPS funcionando vamos ao hotel. No caminho já se percebe a beleza da cidade. Ruas largas e se desenvolvendo como um jogo de xadrez pela orla do Rio (que parece mar). Costeando pela Rambla, que é como eles chamam a avenida beira rio. O hotel se situava no bairro de Pocitos. Local agradável e centralizado. Charmoso diria com precisão. Corre, faz check in no hotel porque a fome está grande (aliás, passar o dia a base de sanduiche de presunto com queijo e amendoim é o forte das companhias aéreas). Escolhe o restaurante baseado em indicação de um amigo. La Perdiz. Um misto de pub e restaurante tradicional. Uma gracinha. Ambiente a meia luz. Pede logo uma garrafa de vinho da terra. Uva Tannat (de origem francesa, se adaptou muito bem no Uruguai e foi adotada como uva nacional). Provolone e chouriço de entrada, bife de ancho de principal, pudim de dulce de leche de postres (ah o doce de leite...), licor de limoncello de exagero, café para fechar. Olha vou falar. Tudo tendo a parrilla (churrasqueira típica uruguaia) ao fundo. Parece que o calor vai aumentando e o tom das conversas também. No fim encontramos os amigos conterrâneos que esbarramos no aeroporto de Goiânia. Mais vinho, mais calor, mais conversa. A viagem tinha começado muito bem.

 

Parrilla do La Perdiz

      

            Diz a primeira regra do viajante que em dia de voo não se deve exagerar na comida e na bebida. Infringir essa regra traz consequências maléficas. No outro dia de manhã a esposa amanheceu com intoxicação alimentar. Conhecedor da sua fragilidade estomacal, recorremos a um casal de amigos que mora em Montevideo. Preciso internar a moça. Depois da broca merecida da amiga do porque não ligamos para avisar da chegada, fomos ao melhor hospital da capital. E quando digo melhor não estou exagerando. Fomos tratados muito bem. Rapidez e profissionalismo. Fiquei sabendo pela amiga que o Uruguai tem a fama de melhor sistema de saúde da América do Sul e que tem a maior frota de ambulâncias per capita. Isso tudo devido a grande quantidade de aposentados que moram na capital. Diria que é a Disney da melhor idade. Soro e exame de sangue. O dia estava perdido. Menos mal. Deve ter sido para compensar o up grade do carro. Se assim foi, estávamos quites. Podíamos voltar à diversão. Não tão diversão foi pagar a conta do hospital. Salgada. Muito salgada. Mas necessária (tomara que o seguro do cartão de crédito reponha). Com o contratempo da internação, perdemos o dia de almoçar no Mercado do Porto. Local indicado por 10 entre 10 visitantes de Montevideo. Passamos o dia com comidas amenas e rápidas. Merecíamos um jantar de gala. E assim o fizemos. Juntamente com os casais conterrâneos fomos ao Francis. Restaurante estrelado e tido como contemporâneo. Perfeito. Decoração de alto gosto. Atendimento delicado e presente. Vinho... ah o vinho. Como estávamos em muitos, foram várias garrafas e várias cepas. Tannat, Carmenere, Cabernet. Uma orgia de sabores e aromas. A comida é uma reedição refinada dos tradicionais pratos uruguaios. Esbaldei-me com as molejittas (bochechas) ao molho de vinho. Ah o vinho... sempre presente. Nas viagens temos uma mania interessante e engordativa. Fazer uso da sequencia completa do jantar. Vinho, entrada, principal, sobremesa (famosos postres) e café. Pronto. Não fugimos a regra. Tudo muito bom. Mais uma vez a conversa agradável juntou-se ao ambiente agradável e a comida e bebida agradável e estávamos todos agradados. Na saída fomos seis adultos no carro para uma carona solidária aos amigos. Nessa hora o aperto do carro e a noite fria não faziam efeito no alto teor alcoólico exarado. Tudo era diversão.

 

Molejittas do Francis

           

Desta feita o dia amanheceu bem. Esposa tinha se contido nos acepipes e descemos para o café da manha com a proa virada para a famosa Punta del Este. Balneário dos habitantes de Caras na América do Sul. Parece que São Pedro adivinhou o dia da viagem, pois mandou um dia ensolarado mas com temperatura amena. Estrada de pista dupla até o balneário. Tranquilo e bem sinalizado. Pedágios mostram o porquê dessa belezura. Sem transtornos. Entramos em Punta e ai entendemos o motivo da fama. Nunca fui à costa do mediterrâneo, mas penso que deve se assemelhar muito. Prédios baixos e caros, restaurantes estrelados a beira mar (ou seria rio?), praia de areias turvas salpicadas por pedras negras. Um luxo só. Passeamos por toda a orla e fomos aos pontos turísticos básicos. Sabe aquele lugar que dá vontade de morar? Pois é. É esse. O programa estabelecido previa um almoço no famoso Cassino Conrad, mas uma dica da amiga que morava em Montevideo nos fez virar no rumo de José Inácio, uma praia paradisíaca que era a nova coqueluche dos casamentos dos milionários brasileiros. No caminho casas belíssimas. Caríssimas. Depois ficamos sabendo que Punta é um “refúgio” fiscal dos milionários do Uruguai, Argentina e Brasil. Como não preciso esconder meus ganhos, afinal ganho muito pouco, fiquei só admirando as belas mansões dos caros arquitetos. Chegando a José Inácio fomos direto ao La Huella (a pegada). Restaurante indicado por 11 dos 10 que visitaram essa praia. Uma cabana incrustada na areia. Um paraíso (única palavra que define). Os atendentes vestidos todos de Lacoste, nos trataram como ricos e famosos. Tudo muito discreto e eficiente. Para variar um pouco na carta vinífera, escolhi uma bodega regional, mas uma uva de origem alemã. A Gewurstraminer. Olha... isso com a vista da praia casou perfeitamente. Pedimos logo uma entrada. Ceviche de corvina. Muito bom. Estávamos apreciando nosso vinho com ceviche quando uma casal sentado ao lado puxou conversa. Eles eram gaúchos mas tinham casa em Punta. Nos contaram que iam no La Huella só para comer o quiche de cebolas reduzidas no vinho Tannat com queijo pecorino. Pensei: “se eles tem casa em Punta e se abalam de lá só para comer essa entrada, seria heresia não experimentar”. Aí entra uma parte lúdica da história. A indicação caiu como uma luva. Que prato delicioso! Suave e intenso, se é que podemos colocar dois adjetivos tão antagônicos juntos. Recomendo a partir de agora. O prato principal foi um peixe grelhado na parrila com puré de calabaza (abóbora) e o restante vocês já devem supor. Não obstante o magnífico almoço, e tendo como norte a gula que nos guia, tivemos que passar para comer as mais famosas medialunas de Punta no Calentitas. Perfeitas. Tome com um cappuccino e aproveite para levar o doce de leite da terra. O ambiente do Calentitas é sui generis. Decorado ao estilo hippie chic, as coisa são dispostas de maneira aleatória e sem seguir um partido decorativo fixo. Tipo aquelas casas decoradas com coisas recolhidas na rua. Muito interessante. Comido e bebido partimos para o famoso por do sol na Casapueblo. Esse programa, também imperdível, é um sonho visionário do artista uruguaio Carlos Vilaró. Uma casa construída em meia encosta de frente para o mar/rio. Arquitetura única no mundo. Mistura das casas de Santorini na Grécia com um toque de taipa feita a mão. Na hora que o sol se põe, escutamos uma audição do próprio Vilaró recitando um texto de sua autoria em homenagem ao astro rei. Fotos e mais fotos e uma sensação da nossa pequenez diante desse fenômeno da natureza. Emocionante, romântico e acolhedor. Voltamos para Montevideo revigorados.

   


Punta del Este e o Restaurante La Huella (a pegada)

 

 


Casapueblo. Por do sol e romantismo (quase não conseguimos tirar essa foto de tanto rir)

 

 
Quiche de cebolas no Tannat e pecorino do La Huella e atum com crosta de ervas do Panini´s

 

 

            Como não poderíamos deixar de fazer, jantamos em alto estilo. Com nossos companheiros de viagem fomos ao Panini’s conhecer a maior adega de Montevideo. O restaurante é um italiano agradável. Pratos grandes e saborosos. E a adega é um caso a parte. Vários rótulos compráveis e incomparáveis. Desta feita um atum com crostas de ervas me seduziu. Mas uma vez a conversa girou em torno dos nossos vícios e prazeres gastronômicos. Os amigos estavam fazendo sua despedida da capital Uruguaia e nós estenderíamos a nossa estada em mais um dia. Despedimo-nos em alto estilo.

 

            O domingo ainda raiava quando saímos em nossa última incursão pelos prazeres da terra uruguaia. Na prazerosa companhia do casal de amigos que divide a morada entre Montevideo e Miami e que nos socorreu no caso do hospital, fomos passear pelo charmoso bairro de Carrasco com seus casarões antigos e imponentes. Uma visita guiada é sempre mais interessante. Ficamos sabendo as particularidades da História do Uruguai, seu socialismo precoce, seu Presidente caricato e sua tentativa de modernização. Uma visita imperdível no mesmo bairro é o Hotel Cassino Carrasco com sua arquitetura palaciana e sua decoração suntuosa. No lobby do hotel encontram-se quatro (eu disse quatro) dos famosos cavalos abajur do design Philippe Starck. Coisa fina. O cassino é um espetáculo a parte. Um misto de sons, luzes, cores e sonhos de enriquecimento fácil. Coisas da ganancia humana. Felizmente esse vício não me seduz e não consegui sequer sentar à mesa para um jogo de blackjack ou uma apostinha na roleta. Menos mal. Fiquei só na admiração. Após o passeio cultural partimos para um passeio que muito me agrada. Vinícola. Partimos para a Vinícola Boutique Bouza. Chegamos já na hora do tour do vinho. Coisa boa para quem nunca fez. Eu como já estou no décimo tour, limitei a apreciar as belas paragens da estância. Tudo cuidadosamente montado para o turismo. Uma exposição de carros antigos e um bistrô de classe completam o cenário bucólico e aprazível. Depois do tour vem a parte mais aguardada da visita. Beber e comer. Pedimos uma garrafa de um dos melhores cortes da casa: Tannat, Merlot e Tempranillo. Néctar dos deuses. Para acompanhar o vinho, jamon serrano de entrada, carneiro com salada de rúcula de principal e principalmente a linda vista do parreiral pela janela. Não nos esqueçamos o creme brulee de sobremesa e o já tradicional café. Depois disso tudo a cama nos chama né? Nada disso. Uma visita breve pelo centro histórico de Montevideo com direito a mais história. Uma das mais interessantes foi a do Palácio Salvo desenhado pelo arquiteto Mario Palanti inaugurado em 1928. O prédio foi erguido no mesmo local onde funcionava a Confeitaria La Giralda no qual foi apresentado o tango uruguaio mais famoso: La Cumparsita (e eu que jurava que esse tango era argentino). Aliás, reza a lenda que o tango foi criado no Uruguai e que Carlos Gardel seria uruguaio. É para matar os hermanos de raiva né não? Mas a particularidade do Palácio Salvo que mais intriga é um homônimo, Palácio Barolo, construído pelo mesmo arquiteto em Buenos Aires. E dizem que um farol no topo de cada prédio fazia a comunicação entre as cidades. É ou não uma história a ser contada? No mais o centro histórico da capital se assemelha muito aos de outras cidades da América do Sul de colonização espanhola. Uma praça central, um belo teatro (Solis), o palácio do governo e prédios tombados. A noite já havia chegado quando fomos fazer nossa última refeição. O escolhido foi o alemão Dackel. Nada mais do que um alemão tradicional. Apertado, móveis antigos, garçons da melhor idade e comida farta. Chopp na caneca de porcelana e Eisben (joelho de porco) com chucrute, batatas e bastante mostarda. Para fechar com chave de ouro, apple strudel. Não poderia deixar de ser. Depois dessa, cama.

 

 
Hotel e Cassino Carrasco e o famoso cavalo abajur de Philippe Starck
 
 



Vinho e Carneiro ao vinho na Vinícola e Boutique Bouza

 

 

 
Palácio Salvo no centro histórico e o Eisben do Dackel
 

Nascer do sol em Pocitos

 

 

 

O dia da volta não é dos meus preferidos. Pula cedo da cama e reza uma Ave Maria para as coisas caberem dentro das malas. Devolve carro. Faz check in. Raspa o último limite do cartão de crédito no Duty Free (que não anda compensando tanto como antigamente). Parte de volta para o Brasil. Viajar é sempre bom, mas já disseram uma vez que voltar para casa é ainda melhor. No aeroporto esperavam dois curiangos ávidos por abraços e é claro, presentes. À hermosa capital Montevideo meu muito obrigado pela hospitalidade. Espero nos vermos mais vezes. A bela Punta del Este um desejo. Quem sabe um dia ter uma bela casa em suas areias brancas. Quem sabe. E quem disse que voltando de viagem temos que parar de sonhar?

 

Papai você trouxe presente?

 

 

 

# agradecimentos fraternos e especiais aos companheiros de viagem Ludmila, Lillian, Marcelo e Floriano pelos jantares divertidos. Aos amigos Rute e Renato pelo socorro prestado e pelos momentos de gastronomia e história do Uruguai. E ao amigo José Luiz Martins (quase um uruguaio) pelas preciosas dicas.

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 07 de junho de 2013