sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Freud é que tinha razão


Freud é que tinha razão

 

            No meu humilde entendimento, todo ser humano que no ato de descobrir que se tornará pai ou mãe, deveria iniciar uma psicoterapia. E vou mais além. Deveria ser bancada pelo governo assim como a bolsa escola, família e gás. Bolsa Psicólogo. E alguns mereceriam até a Bolsa Psiquiatra. Só na base do “tarja preta”. Isso tudo porque associado à alegria e responsabilidade de gerar e criar um filho, vem grátis uma dose cavalar de culpa. Mas coloca culpa nisso. E não venham me dizer que isso só ocorre com marinheiros de primeira viagem e somente nos primeiros anos de vida que eu truco. O ditado popular que diz “filho criado, trabalho dobrado” é clarividente. Cabal. Qual a motivação dessa constatação? Já explico.

            Como a maioria dos que me acompanham já devem saber, minha filha mais velha é pianista. E aí vem a parte do pai coruja, de um talento impar. É detentora de dois primeiros prêmios em concursos nacionais e já cruzou o Atlântico duas vezes para tocar na Itália e Espanha. Isso tudo no auge dos seus nove anos. Eis que esse ano surge a oportunidade da pequena se apresentar no Carnegie Hall em Nova Iorque. Pensa. O templo da música mundial. Nessa hora pai e mãe movem o mundo para criar as condições para a realização do sonho. Não só dela, mas de um grupo todo de pianistas que leva a cultura musical brasileira para outros países. Vale de tudo. Lei Rouanet, Lei Goyazes, Ministério da Cultura. Tudo muito difícil, burocrático e desanimante. Parece que foram criados para não serem usados (assunto que vale outra crônica). Eis que, conversando com uma prima cujo filho é um talentoso escritor mirim, aparece a sugestão de montar um projeto em um site de crowdfunding. O que é isso? São sites que arrecadam recursos para realização de projetos diversos. Contribuições de valores diversos que podem ser efetuadas por pessoas diversas para viabilizar um sonho. Achei uma ideia fantástica. Comentei com a pequena. Seus olhos brilharam. Mãos a obra. Grava vídeo dela tocando e pedindo colaboração. Pega fotos, monta texto, faz cadastro. Em menos de uma manhã o projeto estava montado. Fácil assim. É só colocar no ar. Não é fácil assim. É nessa hora que batem as dúvidas de pai no divã do psicanalista. Não seria exposição demais? Não corre o risco dela se frustrar em caso de insucesso? Não estaríamos incentivando uma carreira de caminhos tão tortuosos em nosso país? Além das dúvidas sócias. Essas campanhas não são somente para pessoas extremamente necessitadas? Não estaria mercantilizando a arte? Não estaria banalizando a música? E logo em seguida vem a defesa. Essa não seria uma oportunidade de quem a acompanha de longe ter a chance de contribuir com a formação de sua carreira? Não serviria esse projeto para ensinar a pequena que só o esforço gera recompensas? Não ensinaria que a vida é feita de vitórias e fracassos e que temos que nos levantar a cada insucesso? Ela não seria mais feliz escolhendo a carreira que quisesse e que fosse mais apta? Será que o conceito de “necessitado” não estaria erroneamente muito restrito a questão financeira? A música (e aí entendam como arte de maneira geral) não é uma necessidade do ser humano? Olha que fiquei chocando essas dúvidas por quase sessenta dias. Dentro da mente de um pai as razões e contra razões se confrontam como gladiadores em derramamento de sangue. Dá vontade de sair correndo.  Agora vocês entendem a necessidade da Bolsa Psicólogo ou coisa que o valha? A dúvida corrói. O temor da falha corrói. A culpa corrói. Os pais são seres de alma corroída. No fundo só queremos o bem para nossos filhos e nossos esforços são sempre nesse sentido, apesar de às vezes não aparentarem. Diante disso tudo qual a decisão tomei?

 


 

É isso. Meu lado positivista falou mais alto e resolvi faze-lo. A cara fica para bater ou para receber elogios. E no fundo quem estava certo era Freud quando dizia que “a culpa de tudo é da mãe” (estendida a mesma ao pai). Mas a culpa nesse momento pouco importa. O que vale, entre erros e acertos, é a felicidade da minha pequena. Dos meus pequenos. Dos nossos pequenos.     

             

             

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 06 de fevereiro de 2015

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