sábado, 27 de dezembro de 2014

O Papa é Pop


O Papa é Pop

 

 

            Inevitável quando se aproxima o fim do ano, são as listas daqueles que se destacaram mais ao longo do mesmo ou os assuntos mais comentados. Ou os dois juntos.  Para não ser diferente da corrente comum vou aqui fazer uso desse artifício, porém não com listas, mas com um eleito só. Sem dúvida nenhuma, para esse que vos escreve, a unanimidade do ano foi o Papa Francisco. Jorge Mário Bergoglio assumiu o papado em março de 2013 em substituição ao taciturno Papa Bento XVI e começou escolhendo um nome bem mais suave e fraternal: Francisco. Quem nessa face da terra já não escutou falar do santo da humildade e dos animais? Já a alcunha Bento não sei dizer nada sobre. E olha que já tivemos 15 antecessores. Outras duas coisas que o tornaram impar foram os ineditismos do primeiro Papa jesuíta e latino americano. Confessamos, nós brasileiros todos, a ponta de decepção pelo fato da escolha ter recaído sobre a Argentina, afinal tínhamos grande chance no certame, mas querer que o Papa e Deus sejam brasileiros é muito egoísmo né não? Pois sei que o homem entrou de sola no cargo. A começar por seu sorriso aberto (bem diferente do Papa Ratzinguer) e suas atitudes franciscanas. Entrou na garagem do Vaticano e colocou a venda os veículos de luxo, mostrando o viés de humildade que norteia sua conduta. Chamou ao diálogo as religiões que vivem se engalfinhando secularmente, mostrando a visão de coexistência pacifica entre os homens. Defendeu os homossexuais e excluídos chamando-os à igreja, colocando o preceito da tolerância e inclusão. Disse até que os cachorros iam para o céu! Pensa bem! Um Papa que no contexto geral parece agradar gregos e troianos. Talvez não se faça tão agradável à parte da Cúria Romana, visto que tem pisado no calo de muitos conservadores da Igreja Católica, mas nem por isso deixa de chamar a atenção das “cabeças coroadas”, como fez essa última semana quando citou as 15 doenças que acometem a direção da igreja. E isso tudo no verbo rasgado. Em latim e demais línguas entendíveis pelos cardeais, bispos e demais membros da igreja. Uma literal lavada de roupa suja em público. Sem papas na língua (perdoem-me o trocadilho infame). Para fechar com chave de ouro o ano papal, por ordem de seu aniversário no dia 17 de dezembro, o Presidente Obama anunciou o reatamento das relações diplomáticas com Cuba e o possível fim do embargo econômico à ilha dos irmãos Castro. Tal atitude foi em grande parte atribuída à intervenção diplomática do Papa Francisco. Sinal de sua capacidade de conciliação e vanguardismo. A única mancha que fica nesse ano de glória de Francisco é a derrota de seu time, o San Lorenzo, na final do campeonato mundial de clubes da FIFA (apesar da vitória inédita da Copa Libertadores da América). Mas também ganhar do Real Madri com essa bola que estão jogando ultimamente é papel para uns três papas e dois santos juntos. De qualquer forma talvez sua intervenção com o Divino tenha feito com que o seu time argentino só perdesse por dois gols. Quase um milagre nas atuais circunstâncias futebolísticas. Agora, para colocarmos o laço de fita no presente, só falta o Pontífice declarar Humberto Gessinger como profeta da Igreja, haja vista sua profecia ter se cumprido. Afinal o Papa é Pop. Literalmente.        

  

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 26 de dezembro de 2014

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

a cerveja da paz


A cerveja da paz

                 

            Essa semana estava eu com queridos amigos degustando algumas cervejas especiais em uma casa especializada no centro da cidade como é de costume no final do ano. Estabelecimento ainda novo com atendimento personalizado, daqueles que o dono vai as mesas fazer as honras da casa. Os garçons muito bem treinados sobre as características da bebida como acidez, toque, fermentação, corpo e outros conceitos que vão se embaralhando no decorrer da degustação. Numa dessas demonstrações, foi levada até a mesa uma cerveja, que eu não conhecia, e entre explicações mil o apresentador falou que era a cerveja preferida do Presidente Barak Obama. Pronto. Lembrei-me que naquele dia coincidentemente, havia sido dado o primeiro passo para a quebra do embargo econômico a Cuba prestado pelos Estados Unidos desde o ano de 1962. Mais de meio século de uma celeuma que marcou a História mundial. Episódios como a Guerra dos Mísseis que quase eclodiu na 3ª Guerra Mundial e a invasão frustrada a Baia dos Porcos permeada por personagens controversos e nada ortodoxos como Fidel Castro, JFK, Che Guevara e Reagan levaram o mundo exaustivas vezes a discutir e refletir sobre quão pode ser danoso a diferença de pensamentos políticos econômicos. Uma nação, no caso cubano, que ficou à margem do desenvolvimento mundial dependendo exclusivamente das migalhas jogadas pela antiga União Soviética sendo utilizada como joguete de uma guerra fria que já teve seu fim decretado há tempos. Uma nação, no caso americano, que foi mostrando cada vez mais seu imperialismo e colhendo ódio e desentendimento de grande parte das nações livres trazendo contra si as sequelas do revanchismo dos mais radicais. Sem fazer juízo de valor de erros e acertos porque em vários pontos do enredo todos estavam errados sempre, vimos uma novela se estender por mais de cinquenta anos e hoje, em pleno século vinte e um, nos parecer filme antigo em preto e branco. Fato consumado. Alguém precisava dar capítulo final a essa história. Coube ao Presidente Obama pelo lado americano e Raul Castro pelo lado cubano o aperto de mão final fechando um ciclo de suas histórias que entendemos não precisar se repetir. Se valer a sugestão para selar esse entendimento sem precedentes, Obama poderia chamar Raul para uma cerveja de sua predileção. Fica a dica. Aquela mesma que me foi oferecida no começo do texto. Eu aceitei o oferecimento e brindei. Não a paz mundial, que é desejo óbvio de miss, mas ao bom senso que entendo existir no interior de cada homem e que deve prevalecer sempre.   

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 19 de dezembro de 2014


 

 

quer conhecer a cerveja preferida do Obama?
 

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

ostra bem


ostra bem

 

            Sabem programa de turismo certo? Aquele que dez entre dez fazem? Pois esse se chama Mercado Municipal de São Paulo. Apesar de muitos não considerarem a cidade um modelo de turismo ideal, vide sua falta de praia e neve, sempre fui fascinado por andar pelas ruas da Paulicéia buscando  peculiaridades e histórias espalhadas pela maior metrópole do país. Nesse contexto a unanimidade é o mercadão. Ponto de encontro dos forasteiros que imergem numa torre de babel de aromas, cores e sabores. Não só nos acepipes comestíveis, mas em sua arquitetura eclética, vitrais coloridos e no burburinho alto dos feirantes. Chega ficar tonto com tamanha efusão e confusão. Nesse instante os que estão lendo devem estar pensando: “daqui a pouco ele vai falar do pastel de bacalhau ou do sanduiche de mortadela do Hocca Bar”. Erraram! Não que não valha destaque. Aliás, pelo contrário. Aos que nunca experimentaram esses dois ícones da gastronomia paulistana, recomendo enormemente. O conselho é que chegue cedo, pois a maioria dos visitantes também são ávidos pela iguaria, o que torna a fila de espera quase interminável em determinados horários. Fora esse circuito clássico do mercadão, basta ficar atento para descobrir inúmeros outros atalhos ao jardim do éden da gastronomia. Quer um exemplo? Na entrada da ala dos pescados logo à direita. Casa das Ostras. Barraquinha de esquina com menos de meia dúzia de mesas altas e banquetas. Alguém em sã consciência não sentaria ali. Mas a questão é que quando se trata de comida, não me considero um cidadão totalmente provido das faculdades mentais. Da última vez que fui estava com a família. Esposa e meus dois filhos pequenos. Pensa em dois meninos no meio do mercado pela primeira vez?! Queria leva-los para conhecer o roteiro clássico, mas as ostras frescas me olharam de uma maneira irresistível. Pensei que uma paradinha para “algumas” ostras não faria mal antes do almoço. Estava lotado. Pensei em desistir devido à falta de mesa. Com criança é mais complicado. A esposa pediu paciência e logo a Santa da Mesa Desocupada nos atendeu com uma no canto e sentamos espremidos em meio aos demais comensais. Pede uma porção de ostras e um chopp. Só para abrir o apetite. Os meninos avistam uma porção de lulas fritas. Certeza. “Papai, eu quero!!”. Pede também. A mesa mal cabe os dois pratos e o chopp. Vamos fazer um aparte para o chopp. Ir à sampa e não tomar uma caneca ou várias no mercado é considerado no manual do gastrônomo amador uma heresia sem perdão. Como não gosto de pecar pedi logo o segundo. Daquele preto com a espuma cremosa. E vai ostra e vai lula e vai chopp. Não nessa mesma ordem. O que devem estar pensando em como ter coragem para comer frutos do mar no meio do mercado de São Paulo vai um ditado antigo que diz sabiamente: “o que não mata engorda”. Só para constar nas minhas estatísticas estomacais, nunca tive nem um revertério comendo no mercadão. Tudo parecia muito bem, mas eis que no meio da refeição, pela proximidade das cadeiras, dois homens que estavam na mesa ao lado puxam assunto e dão uma sugestão: “compre camarão do grande na barraca do lado e peçam para fritar no alho e óleo”. Pronto. Sugestão acatada. Compra um meio quilo daquele camarão de ver Deus (que na sua terra vale 3 dígitos o quilo) e pede a garçonete para preparar. Olha... olha... olha! É de comer ajoelhado. Casou com o chopp e os dois viveram felizes para sempre. No final das contas, o pastel de bacalhau e o sanduiche de mortadela ficam para a próxima feita, em virtude de refestelamento precoce. Você sai de lá rico, bonito e satisfeito. Comida simples, fresca e bem feita. Junta com a presteza do atendimento paulistano e a carga histórica do local e pronto. Se eu fosse jurado da Michelin era estrela na certa.       

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 12 de dezembro de 2014
 
 
abriu o apetite?
 


 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

doença ou cura?


Doença ou cura?

 

            Estava eu, nessa manhã, comprando apressadamente um suco na padaria perto da escola dos meus filhos (porque filho lembra que tem que levar as coisas para escola na última hora) quando, no caixa, vi fixado um cartaz com os dizeres: “contrata-se atendente – salário + vale transporte + vale alimentação – tratar aqui”. Parece um cartaz normal não é? Mas não é. A letra que oferece o vale alimentação está o dobro do tamanho da letra que oferece o salario e o vale transporte. Por quê? Um turbilhão de reflexões me veio à mente. Vale uma crônica. Ô se vale.

            Nunca antes na História desse país se discutiu tanto sobre programas sociais. As chamadas bolsas assistencialistas encontram defensores árduos e críticos vorazes, além de uma massa que é beneficiada e logicamente aquiesce do fato. Esse Estado paternalista foi institucionalizado por Getúlio Vargas em meados de 1900 que consolidou as leis trabalhistas através do decreto lei 5.452 de 01/05/1943 que garantiu direitos básicos dos trabalhadores. Como um processo de evolução, esse modelo migrou para os benefícios assistencialistas, como alimentação, escola, gás entre outros, sendo muito explorados politicamente pelos partidos que implantaram ou se apropriaram desse viés. Em virtude disso, houve uma institucionalização das bolsas, bastante percebido nas eleições de 2014, onde quem não se alinhou a continuidade dos benefícios perdeu pontos e principalmente votos. Resumindo, as bolsas assistencialistas se incorporaram extra oficialmente a CLT. São direitos incontestes dos trabalhadores e não trabalhadores. Os defensores do modelo pregam que existe uma próxima fase, que seria a qualificação do cidadão beneficiado para que ele possa se despregar da bolsa e consiga caminhar pelas próprias pernas. Seria o famoso “não dar o peixe, mas ensinar a pescar”. Ainda nessa linha os defensores argumentam que “ensinar a pescar” um cidadão que passa fome e privações básicas, não resolveria o problema, e por isso, necessitaria de um estágio anterior justificando o benefício das bolsas. Os críticos defendem a ideia que não passa de uma ação politiqueira que utiliza da máxima do estado romano do “pão e circo” para alienar a população e transformá-la cada vez mais em massa de manobra. Além disso, criticam a falta de evolução para a próxima fase de descolamento colocando dúvidas se realmente os assistencialistas querem essa evolução ou simplesmente almejam manter a população sob sua asa paternalista. Coisa que também não seria novidade, já que o então “pai dos pobres” Getúlio, já fazia isso desde o começo do século XX.

            Qual a minha opinião? Posso exprimir em uma palavra. Decepção. Isso me acomete quando vejo um cartaz de oferta de emprego que tem como principal atrativo o assistencialismo. Salário, vale transporte, vale alimentação, plano de saúde, plano odontológico, etc. Sou de uma geração que acredita na capacidade produtiva. Na remuneração por esforço e meta. Não quer dizer que não defenda com unhas e dentes benefícios para meus funcionários. Pelo contrário. Mas entendo que deve fazer parte do processo de remuneração. Tudo conversado previamente e acordado. Aquilo que é dado de graça sem anteceder o esforço e a dedicação se esvai depressa ou pouca valoração tem para quem recebe. Um trabalhador motivado que vista a camisa da empresa e cumpra suas metas deve ser bem remunerado através de seu esforço e de programas de distribuição de lucros das empresas. Assim ele poderá por seu mérito crescer e dirigir sua própria carreira sem necessitar de assistencialismo. A maioria dos empresários e trabalhadores pensa assim? Com certeza não. Utópico? Prefiro pensar que seja um objetivo de longo prazo. Melhor seguir assim do que andar pelo caminho que estamos trilhando, onde não temos certeza se estamos caminhando para a cura ou para a doença. Pensemos.      

 

# crônica dedicada ao amigo Jones

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 05 de dezembro de 2014
 
 
 
 
 

 
 
 
 

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Fred Picadinho


Fred Picadinho
 
 
 
            Sabe qual a expressão mágica para um glutão como o que vos fala? “O melhor...”. Pensem se não é irresistível: “o melhor bolo de chocolate do mundo”, “a melhor lasanha caseira do Brasil”, “o melhor quibe da América Latina”. Para mim parecem aqueles desenhos animados onde a cheiro da comida sai da panela e vem flutuando até o nariz e carrega o comensal até o prato. Há muito tempo tinha ouvido falar do picadinho do restaurante Fred na capital federal. Intitulado “o melhor picadinho de Brasília”. Pronto. Atraiu. Bastou um amigo convidar para almoçar lá que de imediato a boca encheu de água pensando no acepipe. O amigo “convidante” ainda deu a opção de mudar de restaurante, mas meu estômago já tinha fotografado o picadinho. Não podia ser outra coisa.
 
            O restaurante se parece com milhares da capital. Entrada estreita e cheio de executivos. Somos rapidamente acomodados e nem olhamos o cardápio. Picadinho para dois. Logo chegam as panelas. Isso mesmo. As panelas fundo triplo da Tramontina vão direto a mesa. Arroz branco (pasmem não ser arroz com brócolis a comida típica de Brasília), farofa daquelas fininhas que causam engasgo nos desavisados (pasmem novamente por não ser farofa de ovo, outro ícone comparável ao arroz com brócolis). Até aí nada de novidade. Mas nesse ponto vem uma banana a milanesa... frita a perfeição... Sabe aquelas bananas que não parecem que foram fritas? Sem uma gota de óleo sobrando. Ou foram feitas nessas modernidades de panela que frita sem óleo ou o cidadão secou no papel toalha. Posto os três acompanhamentos no seu prato, vem a frigideira gigante com o picadinho que é despejado fumegante na sua frente. Filé picado na ponta da faca e champignons ao molho roti. O cheiro é de enlouquecer. E não esqueçamos a cereja do bolo, ou melhor dizendo, o ovo pochê com a gema ainda mole. Aí é só usar generosamente o Tabasco e partir para o abraço. Quem inventou essa combinação deveria ganhar um prêmio Nobel da gastronomia. Pensam que acabou? Não. O garçom fica passando com a frigideira fumegante e “cheirenta” entre as mesas fazendo a reposição dos pratos. Não recomendo para quem é desprovido de limites para comer. Corre um sério risco de “empanturramento”.
 
            E aí vem a pergunta crucial: é o melhor picadinho de Brasília? Respondo com toda certeza: O melhor que já comi na capital. Se alguém tiver outra opinião ou souber de outro melhor, aceito o convite para contra prova. Afinal sou um glutão democrático. Direito da ampla defesa como princípio básico. E os que não discordam, convido a provarem. Vale a pena.      
   
 
 
 
Guilherme Augusto Santana
Goiânia, sexta feira 27 de novembro de 2014
 
 
 
Fachada do Fred
 


O melhor picadinho de Brasília

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Francisco, Joaquim, Antônio e outros brasileiros


Francisco, Joaquim, Antônio e outros brasileiros

 

            Batizado Francisco, porque não haveria de ser aceito seu nome africano, Zumbi nasceu na Serra da Barriga, antiga capitania de Pernambuco. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1600. Nascido dentro do Quilombo dos Palmares, desde cedo se mostrou um bravo guerreiro e teve por destino assumir o comando do quilombo até a sua extinção nos idos de 1694. Foragido só conseguiu resistir até o dia 20 de novembro de 1695 quando foi preso, morto, decapitado e levado as autoridades para comprovação do feito. Zumbi poderia ter sido confundido com milhares de negros que foram despejados no Brasil da era colonial e que perderam suas vidas lutando pela vida dos conterrâneos. Milhares e milhares que morreram anonimamente sem ao menos uma lápide para guardar a memória de seus nomes. Assim poderia ter sido Francisco. Mas quis o destino que a coroa portuguesa amargasse 95 anos de resistência do quilombo mais famoso da história brasileira e transformasse seu último líder em mártir. Entrou para História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente não quis livrar o Brasil do julgo português mas sim ter uma vida liberta para seus pares.
 
            Batizado Joaquim, porque havia de ser filho legítimo de portugueses, Tiradentes nasceu no Distrito de Pombal, antiga Capitania de Minas Gerais. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1700. A alcunha veio do ofício de dentista, que por sinal não foi o único, tendo exercido as ocupações de tropeiro, minerador, comerciante, militar e por derradeiro mártir (ou bode expiatório para o lado B). Conseguiu resistir até 21 de abril de 1792 quando foi executado, esquartejado e teve seu sangue utilizado para lavrar a certidão de cumprimento de sua sentença, julgado pelo crime de lesa-majestade. Tiradentes foi um dos muitos que se voltou contra o julgo e a sede de riquezas da coroa portuguesa. As veias abertas do ouro e pedras despejando além Tejo enquanto a maioria dos brasileiros vivia na precariedade. Milhares e milhares que lutaram pelas injustiças instituídas e não tiveram nem uma linha escrita nos livros. Assim poderia ter sido Joaquim. Mas quis o destino que seu nome estivesse no meio de outras tantas figuras importantes e, por menor hierarquia, fosse dado de boi de piranha a sanha de “justiça” dos portugueses. Entrou para a História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente quis livrar o Brasil do julgo de seus ascendentes, mas com certeza queria mesmo era não ser vilipendiado com os impostos exorbitantes.
 
            Batizado Antônio, porque seus pais religiosos faziam questão, Conselheiro nasceu na cidade de Quixeramobim, antiga Província do Ceará Grande. Isso tudo do meio para o fim dos anos 1800. Parece que sua sina estava ligada a religiosidade e penitencia, pois além do desejo atroz de seus pais pela vida clerical, fez-se seu ofício a advocacia dos pobres e desvalidos. O infortúnio da descoberta da traição de sua esposa levou Antônio Conselheiro a se exilar na região de Sobral onde lhe restou a penitência e a peregrinação. Muitos se juntam a ele, já um fora da lei, e surgiu então o Arraial de Canudos, renomeado pelo seu criador como Belo Monte. Tornou-se desafeto do recente governo republicano por supostamente abrigar recém-libertos escravos, pobres de toda ordem e fanáticos religiosos que viam em Conselheiro um milagreiro do sertão. Conseguiu resistir até 22 de setembro de 1897 quando morreu de causas desconhecidas. Matado ou morrido. Teve o túmulo profanado, a cabeça cortada e levada à Faculdade de Salvador para estudos. Nunca mais se juntou corpo e cabeça. Conselheiro foi dos muitos que por uma desilusão pôs-se a peregrinar e juntar os desvalidos em torno de suas asas como um pai que alenta o sofrimento alheio. Milhares e milhares que lutaram pelos mais pobres e nunca tiveram seu busto na praça de nenhum pobre vilarejo. Assim poderia ter sido Antônio. Mas quis a República do Brasil que ele servisse de exemplo para todos aqueles que ousassem enfrentar o novo e garboso Estado Republicano. Entrou para a História e para os livros de História. Foi um cidadão que provavelmente não quis retornar à monarquia, mas tão somente dar alento ao sofrimento dos desvalidos.
 

Levando em consideração as descrições acima responda a seguinte questão do ENEM:

 

1)    Apesar de se tratarem de três figuras históricas ilustres, somente um deles foi alçado ao posto de herói brasileiro, tendo sido agraciado com um feriado nacional por ordem da sua data de falecimento e também cidade batizada com seu nome. Baseado no conhecimento da sistemática de produção da História Brasileira, em consonância com o preconceito racial ainda predominante no país e com a intolerância religiosa crescente na sociedade brasileira, e ainda coadunando com a máxima de que “a História é escrita pelos vencedores”, de qual desses personagens estamos nos referindo?

 

Vale uma balinha.   

 
 



Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 21 de novembro de 2014

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

nosso quem cara pálida?


Nosso quem cara pálida?

           

            No fim dos anos noventa, estava eu a serviço na cidade de São Paulo quando recebi um telefonema do diretor técnico da empresa na qual trabalhava, me designando missão de representa-lo em uma concorrência pública no Rio de Janeiro. Como não é de meu feitio recusar serviço, ainda mais no Rio, atendi de bate pronto à convocação. Separei uma mala de mão com um short, camiseta e chinela. Não dormiria no Rio, mas estando tão próximo à praia não poderia deixar de molhar meus pés rachados de goiano nas águas salgadas do mar. Trajando terno, que essas formalidades exigem, comprei a passagem da ponte aérea e embarquei na manhã seguinte. Quando a aeronave apontava para descer no Santos Dumont, principiou a tocar o Samba do Avião de Tom Jobim. Acho que fazem isso de propósito para que você fique ainda mais maravilhado com aquela cena bela. Naquele momento dei-me conta que não conhecia a cidade maravilhosa. Havia estado no Rio, mas apenas de passagem em aeroportos. Emocionado desci e já parti direto para o compromisso que tinha hora marcada. Cessada a obrigação, alcancei um taxi e perguntei ao motorista qual era a praia mais próxima. Copacabana foi a resposta. Nada mais clássico. Embarquei no taxi e mandei seguir para a praia. No caminho pensei que passaria vergonha, pois usava terno, notadamente inapropriado para o local para onde me destinava. Chegando a Copacabana pude perceber meu erro. As tribos que desfilavam por seu calçadão eram infindáveis. Ondas de turistas em todos os trajes, cores, línguas e classes sociais. Mais a vontade corri ao banheiro público e fiz a troca de roupa colocando o terno na mala de mão. Sentei-me na primeira barraca na beira do calçadão, pedi uma cerveja gelada e a partir daquele momento pude observar o porquê do Rio ser a cidade mais cantada em versos e prosas. Acordei do sonho quando percebi que tinha de voltar a São Paulo e de imediato desfiz a troca de roupas e parti novamente rumo ao aeroporto. Muitas coisas tinham me impressionado no Rio. Literalmente as coisas que fascinam a todos. Mas uma em particular por estar ligada a minha profissão e naquela época ser ícone de empresa bem sucedida. A concorrência tinha acontecido na sede da Petrobras no centro do Rio. O Edise, como é conhecido o edifício, era um marco da arquitetura brasileira e espelhava, à época, um conceito de estabilidade e competência de uma empresa que até então era o desejo de consumo daquele jovem engenheiro que participava do certame licitatório. A cena daquele edifício, com seus belos jardins internos, nunca saiu da minha lembrança assim como as ondas do calçadão de Copacabana e o Cristo redentor visto da janela do avião.

 

Por esses dias estava assistindo o filme “Getúlio” do diretor João Jardim, e não obstante a minha grande admiração pela figura histórica do caudilho, chamou-me atenção o seu início quando o então Presidente eleito narra brevemente sua histórica política e seus feitos. Entre outros, que não são poucos, ele cita a criação da então Petróleo Brasileiro S/A, a Petrobras. Na hora me veio à mente a imagem do edifício sede no centro do Rio e confesso que emocionei com a lembrança. Não sei se bem pela imponência que havia causado em um engenheiro recém-egresso da faculdade ou pela carga dramática de um filme que retratava principalmente a crise de consciência de um Presidente que culminou no ato cabal de seu suicídio, ou ainda um misto dos dois. O fato é que os momentos foram se ligando e culminaram na atualidade onde a empresa passa por uma crise de identidade sem precedentes em sua história. Fiquei imaginando o que diria Getúlio Vargas vendo o que foi o maior orgulho dos brasileiros se transformar na maior chacota da era republicana. Com certeza laçaria mão de sua pistola de cabeceira e novamente alvejaria seu coração para se livrar da vergonha. Palavra, essa vergonha, que falta aos homens públicos de hoje. Obstante o vilipêndio vexatório, a Petrobras sobreviverá. Creio nisso. O que não sobreviveu foi o ideal inocente daquele engenheiro recém-formado, que por muito tempo coincidiu com o sentimento da maioria dos brasileiros de acreditar que o petróleo era nosso. Nosso quem cara pálida?              

 

      

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 14/11/14

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

vende-se fusca 87


Vende-se fusca 87

           

 
            A notícia de destaque da semana foi a suposta oferta de um milhão de dólares proposta por um suposto Xeque árabe para arrematar um fusca 87. Mas não é um fusca qualquer. Trata-se do veículo pertencente ao caricato Presidente do Uruguai José Mujica. Temos nos deparado, desde que assumiu a Presidência, com um desfile de situações inusitadas proporcionadas por Mujica, sendo a mais emblemática delas o meio de condução do mesmo. Enquanto a grande maioria dos chefes de Estado utiliza todo um staff de proteção para sua locomoção, Mujica, ao contrário, se utiliza de veículo próprio, dito um fusca azul celeste ano 87, sem nenhum segurança a tira colo. Chega a ser engraçada a situação. Fora a parte curiosa do fato e do comportamento simplório do Presidente, o Uruguai sempre esteve nas telas mundiais como um país inovador e precursor de medidas relacionadas a direitos civis e democratização da sociedade. Entre outros feitos, foi o primeiro país a legalizar o divórcio, segundo país americano a conceder direito de voto as mulheres, primeiro país sul americano a legalizar a união entre pessoas do mesmo sexo e recentemente o primeiro país a legalizar o cultivo, a venda e o consumo da cannabis, vulgarmente conhecida como maconha. Faz parte da sua História esse movimento social colocando o país como uma das democracias mais estáveis do globo. E aí para colocar o laço de fita no presente, a cereja no bolo, somos presenteados com essa figura pitoresca e lendária que é o atual Presidente. E se não bastasse a maneira franciscana dos modos do governante, a suposta destinação do recurso oriundo da venda de seu fusca foi cogitado por ele ser aplicada em programa de construção de residência para população de baixa renda de seu país. É ou não um tapa na cara de muitos governantes que veem a política como forma de enriquecimento ou ascensão somente pelo poder? Se eu fosse chefe de Estado nesse momento estaria imensamente envergonhado. Os motivos pelo qual o Xeque árabe fez a proposta não estão em análise nesse momento, apesar de pressupor que seja somente para aparecer, mas o que mais importa nesse momento é a atitude de Mujica em destinar um bem próprio (superestimado temos que admitir) para um programa social dos habitantes que o elegeram. E aí vem o ponto. Elegeram-no exatamente para isso. No mais ele somente cumpre a sua função. Não vamos fazer aqui uma pregação de atitudes franciscanas para todos os políticos do mundo, até porque isso é impossível, mas que sirva de exemplo a essência pregada por Mujica. A responsabilidade para com a coisa pública e o cumprimento da real função de governante e representante do povo.  Independente de tudo isso um aviso importante precisa ser dado. Se realmente o Xeque árabe adquirir o fusquinha, melhor que ele abasteça pelo Uruguai mesmo, porque se atravessar a fronteira do Brasil já vai pegar o aumento dos combustíveis. Aí não sei se ele conseguirá pagar.                  
 


 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 07/11/14

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

chove chuva pelo amor de Deus


Chove Chuva pelo amor de Deus

 

 

Nunca antes na História desse país se acompanhou tão detidamente o volume dos reservatórios do sudeste como nos tempos atuais. Todo dia sai uma parcial do percentual restante, igual à cotação do dólar, a bolsa de valores e o preço do litro da gasolina. Igualmente temos o ineditismo do descobrimento dos nomes indígenas dados aos sistemas de abastecimento de água: Guarapiranga, Cantareira, Ato Tietê. Parece até livro de José de Alencar. Porém uma coisa que não é inédita, sendo pelo contrário lugar comum é a mania de jogar a culpa em outrem. O Governo do Rio culpa seu vizinho São Paulo que culpa a população que gasta muita água que culpa a Dilma que culpa São Pedro que acaba absorvendo a culpa sem reclamar. Ninguém aprendeu ainda a olhar para o umbigo. Os governos com sua falta de planejamento só conseguem apagar os incêndios (quando conseguem já que está faltando água). A população que se acostumou com a lenda de que o Brasil é o país da fartura e agora “farta” água (péssimo o trocadilho, porém inevitável).  E São Pedro que vive pregando peças e vendo o circo pegar fogo. Aqueles adeptos das teorias da conspiração, de bate pronto, diriam que é algum plano malévolo de alguém que tem interesse em diminuir a população do sudeste já tão abarrotado de pessoas. Tipo seleção natural. Os religiosos fervorosos diriam que é castigo divino em virtude do excesso de pecados e o resultado da eleição para Presidente. Os cantadores de cordel poetizariam que se trata de sina dos nordestinos que migraram fugindo da seca e a mesma seguiu seus passos. Os otimistas diriam que é coisa passageira e que logo tudo voltará ao normal. Os pessimistas, por sua vez, diriam que pior será quando começar a chover canivete. E aí poucos pensaram que juntamente com as exceções da mãe natureza, em sua mudança constante, associada ao maltrato constante do planeta, quer seja com consumo desenfreado de insumos e aumento insensato da população, somado ao cego imediatismo governamental e ao egoísmo humano do tipo “farina pouca, meu pirão primeiro”, podem estar causando os problemas que enfrentamos. Mas é muito complexo pensar dessa forma. Como uma teia que se entrelaça e cada fio puxado interfere no todo. Mais fácil supor causas simplistas e simplesmente passar a batata quente para a mão do vizinho. Ou ainda acreditar na profecia de Antônio Conselheiro quando previu que o sertão viraria mar, mas que havia o medo que o mar também virasse sertão. Se assim o for, melhor ajoelhar e rezar. Mas rezemos com parcimônia para não agastar a fúria divina. Vai que vem um dilúvio por ai.         
 
 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 31/10/14

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Brasil B


Brasil B

           

            Quando escutei, pós-eleição, os comentários estapafúrdios, insensatos, imprudentes, sem noção, preconceituosos, xenofóbicos e imbecis sobre a separação do Brasil fiquei extremamente decepcionado com tamanho descabimento. Seria cômico se não fosse trágico. Mas passado o susto e a indignação, fiquei exercitando a mente em relação ao fato. Como uma licença poética. Imaginemos se realmente tivéssemos que passar um muro dividindo o país de acordo com o resultado das eleições. Pensa na fuzarca. Pra começar quem ficaria com o nome “Brasil”? E o outro país se chamaria “Brasil B”? Acho que talvez para não gerar discórdia poderíamos adotar Aeciolândia e Dilmópolis. Aí capaz de não dar briga. Resolvido. E a capital? Aeciolândia provavelmente continuaria com Brasília, apesar de que São Paulo seria um nome forte. Talvez até Porto Alegre para evitar outra revolução farroupilha. Mas e Dilmópolis? Poderia retornar a Salvador ou Rio de Janeiro, já que um dia foram capital. Mas sem dúvida se for por merecimento seria São Luiz, cujo estado deu a maior vitória proporcional a Dilma. Poderíamos pensar ainda em Belo Horizonte, só para afrontar o Aécio. Mas aí geraria guerra e isso nós não queremos né? Outro problema grave seria o que fazer com o Estado do Espírito Santo. Se notarem bem, a linha do muro passa por Minas Gerais contorna o Espírito Santo e depois retorna para pegar o Rio de Janeiro, ou seja, deixaria ilhado o Estado Capixaba. Uma solução interessante seria dinamitar as fronteiras do Estado e transformá-lo em uma ilha. Já pensaram que lindo? Ilha do Espírito Santo. Do tipo joga-la para o oceano como quem diz: “vai tartaruguinha!”. O problema é se ele, o Espírito Santo, afundar. Nessa mesma situação estaria o Estado de Roraima, que incrustado em Dilmópolis, deu vitória a Aécio. O jeito seria vender para a Venezuela e ganhar uns trocados. Ajuda a pagar as despesas da campanha eleitoral. E para construir o muro? Pensa na marmota?! Além dos obstáculos naturais teríamos que enfrentar o superfaturamento que geralmente acompanha essas obras de grande vulto. Pintaríamos o lado de cima de vermelho e o de baixo de azul. Mas antes de iniciar a separação teríamos que fazer um recadastramento dos brasileiros. Cada um no seu Estado de origem. Abandona tudo que construiu e corre para casa. Aí vai ser um deus nos acuda. É filho separando de pai e mãe, marido de mulher e sogra de genro (coisa que não é de todo ruim). Teríamos que mandar todos os nordestinos que moram em São Paulo de volta. Os que moram em Brasília também. De Brasília sairiam também os cariocas que vieram quando da mudança da capital, e os mineiros que vieram ajudar. Aí teríamos que repovoar a capital, porque iria praticamente todo mundo embora. Os gaúchos tem que descer p/ o Rio Grande. Aí enrolou. Estão espalhados pela Bahia, Tocantins, Pará, Maranhão, Minas Gerais e Miami. Ah não! Miami o Aécio ganhou. Podem ficar por lá. Os baianos artistas (praticamente todos) teriam que voltar para a terrinha, o que tornaria a Bahia o Estado com maior número de artistas desempregados de Dilmópolis. É nesse interim que entendemos que até o realismo fantástico ou o surrealismo imaginativo têm suas limitações. Como arrancar do goiano a raiz mineira? Como tirar de São Paulo o nordestino que adotou a cidade como sua? Como só ir às praias frias de Santa Catarina? Como recolher os gaúchos espalhado por cada canto desse país produtivo? Sempre nos orgulhamos da nossa diversidade e tolerância, e não será agora que deixaremos que isso se perca. Eu não quero ser cidadão de Dilmópolis e nem de Aeciolânia. Eu sou brasileiro. Com muito orgulho. Com muito amor.        

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, 28/10/14

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

iiiiiiiit´s time!


iiiiiiiiiit´s time!

 

 

           

          Senhoras e senhores bem vindos à luta principal desta noite. No canto azul, pesando quarenta e cinco gramas, vindo direto das Minas Gerais, com um sorrisinho sarcástico no rosto, ele, o neto de Tancredo, Aécio Neeeeeeves!!!! E no canto oposto vermelho, pesando mais do que Marina Silva, vinda direto do Palácio do Planalto, com cara de quem acordou agora, ela, a filha do Lula, Dilma Rooooousef!!! Em disputa essa noite a tão cobiçada faixa presidencial. A petista defende o título e o tucano tenta a quebra da hegemonia da estrela vermelha. Os oponentes se cumprimentam tocando as luvas e olhares de poucos amigos e se posicionam em seus cantos. Vai começar o espetáculo. IIIIIIIIIIIIIIIIIIt´s time!

          Dilma começa desferindo um “porque o senhor não soprou o bafômetro quando parado na blitz da lei seca” direto no olho esquerdo de Aécio. O tucano dá uma esquivada e solta um “onde a senhora estava quando roubaram a Petrobrás debaixo do seu nariz” na ponta do queixo de Dilma. Aproveitando que a Presidenta abalou-se com o golpe, Aécio desfere um “e seu irmão que foi funcionário fantasma na prefeitura petista de Fernando Pimentel em BH” na região do abdômen. Sem se fazer de rogada, Dilma manda um “e sua irmã que foi contratada pelo governo de Minas Gerais” direto no olho direito do tucano. E a luta continua aguerrida. Golpes de ambas as partes. Dilma, aproveitando um cochilo do adversário desfere um “como será tratada a inflação no seu governo” nas partes baixas de Aécio, o que é entendido como golpe baixo pelos juízes. Mas não é levado em consideração porque o tucano também tentou agarrar um “e a questão da saúde” nos cabelos da adversária. Golpe baixo não gente! Vamos manter a postura. Dilma desfere vários golpes de “e a construção do aeroporto de Cláudio nas terras de sua família” e “seu Ministro da Fazenda quebrou o país três vezes” na linha de cintura do adversário, que prontamente responde com uma série de “a senhora é uma incompetente e leviana” e “o seu Ministro da Fazenda é um fantoche” no rosto da petista. Parece que os dois candidatos não medem esforços para levar o outro a lona. E de repente diante de dois golpes desferidos simultaneamente a respeito dos mensalões tucano e petista, os dois oponentes caem. Parece cena do filme Rocky o lutador. Exauridos tentam se erguer diante da lona encharcada de sangue e lágrimas. Os seus treinadores FHC e Lula gritam palavras de incentivo. Aquele que se levantar primeiro será Presidente. Eles se levantam e caem novamente. Não tem forças morais para se sustentarem. São levados às pressas para o hospital. As notícias chegam atabalhoadas. Todos preocupados com os lutadores, mas felizmente ambos estão fora de perigo. Quem não está nada bem é o povo brasileiro. UTI. Não aguentou tamanha baixaria. Não sabemos se haverá recuperação.      

 

  

           

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 17 de outubro de 2014

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

os cães ladram, mas a caravana passa


Os cães ladram, mas a caravana passa.

 

           

Recordo-me bem de um fato político que ocorreu quando ainda era criança. Marcou-me profundamente a eleição de 82 para governo do Estado de Goiás. Era a primeira eleição após o relaxamento do regime militar que encontraria seu fim três anos depois. Campanha na rua e ânimos acirrados. Eu estava então com sete anos, e por uma influência paterna, estive por vezes perto da campanha daquele ano. O então candidato Dr. Otávio Lage de Siqueira, ex-governador, rivalizava com o jovem Iris Resende encenando uma disputa que representava o velho regime militar e o novo regime democrático. Lembro como se fosse hoje de esperar a chegada de Dr. Otávio, em um campo de pouso de terra em alguma dessas cidades do interior de Goiás que minha memória não alcança mais, e ele colocar sobre minha cabeça um chapéu com o número 1 de sua candidatura. Aquilo para um menino resultou numa admiração sem fim, que contribuiu muitos anos após, no nome do meu filho mais novo, da mesma alcunha Otávio. Lembro também como se fosse hoje do acirramento da campanha de rua, revestido várias vezes pelo ódio político partidário. Penso hoje que tenha havido uma parcela de desejo de manifestação reprimido pelos anos de chumbo, misturado com o desejo de mudança tudo somado na eleição de um suposto salvador da pátria. Mas à época não entendia o ódio desferido contra aquele homem que havia me presenteado com um chapéu e por quem cultivava uma admiração infantil. Ódio de xingamentos que via brotar até de pessoas mais próximas a mim e com quem várias vezes bati boca procurando defender o meu suposto candidato. Coisas de criança que tem a pureza dos sentimentos sobrepondo outros conceitos como rivalidade, política ou poder. Hoje já com certa idade (sem números), consigo enxergar melhor as motivações históricas e sociais que levaram aquelas reações exageradas. Muitas vezes não são pessoas e sentimentos em questão, e sim movimentos muito maiores que empurram a marcha da História.

            Hoje de manhã recebi um whatsapp de um grupo de pais do colégio onde meus filhos estudam. Um pai fazia um desabafo sobre o ódio político que esta se disseminando nas crianças. Reações por vezes exageradas dos pequenos demonstrando que algo de estranho estava acontecendo. Lembrei-me de pronto da história narrada no primeiro parágrafo e senti certa angústia. Eu já havia percebido há algum tempo esse acirramento do ódio político subir no termômetro das eleições desse ano. Principalmente em relação ao pleito de Presidente da República. Posições muito acirradas e culminando para o lado pessoal que lembram brigas de galo. Cada um que afie sua espora. Não tenho visto análises sensatas sobre propostas ou mesmo posições de governo, e sim pintura de guerra como se fosse questão de vida ou morte. De forma nenhuma quero aqui fazer juízo de valores sobre os candidatos e as plataformas partidárias de cada um, até porque na minha opinião, e quem já leu minhas crônicas sabe disso, tenho um entendimento mais cíclico da História. Não acredito em grandes mudanças com governo A ou B, e sim mudanças lentas e graduais na cultura do povo. Mas isso é outro assunto para outra crônica. O que mais me chama a atenção nessa atual conjuntura e o fomento do ódio político em nossas crianças. E não só político, mas de qualquer ordem. As mentes frágeis e sem proteção não conseguem distinguir entre a intolerância a um tal candidato e ao empregado que serve em sua casa, ou mesmo um vizinho de outra religião, ou um coleguinha de outra cor. Esses pensamentos de massa só servem para cegar os entendimentos e fomentar a intolerância. As crianças vendo seus pais e os mais próximos com reações exacerbadas e irracionais por vezes, vão se valer desse exemplo e usá-lo na formação de suas individualidades. Pensemos nisso antes de expor nossas opiniões e torcidas. Pensemos em nossos filhos e sua formação social e política. Não estou aqui dizendo para alija-los do processo, tal qual o pensamento antigo que política não é para crianças, mas educa-los para a tolerância. Tolerar a opinião do próximo por mais absurda que isso possa lhe parecer. Só assim conseguiremos uma democracia de fato. Só assim teremos uma conscientização política social de fato. Afinal, apesar do ladrar dos cães nas campanhas políticas, a caravana da História acaba passando. Só não podemos deixar como resultante disso o ódio e a intolerância. Pensemos.              

 

 

 

 

Guilherme Augusto Santana

Goiânia, sexta feira 10 de outubro de 2014

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

a César o que é de César




 
A César o que é de César
 
            Saiba o caro leitor que enxerga essa junção de letras, palavras, frases e, por fim textos, que não sou escritor de profissão. Se é que existe essa profissão formal. Nem ao menos sou da área de letras. Jornalismo nem pensar! Sou oriundo da mais perfeita profissão exata, a Engenharia Civil. Pretensão orgulhosa. Não obstante, me enveredei pelo mundo funerário. Pasmem! A alcunha de “Coveiro” recebi e adotei com orgulho pretensioso. Mas as letras, além dos números, sempre fizeram parte da minha vida. O papel sempre sofreu com minha tentativa de plasmá-lo com ideias ortodoxas ou não. Portanto, quando perceberem pequenos (ou grandes) erros na grafia e no sentido formal da regra gramatical, além da “liberdade” poética, necessito do perdão, visto as justificativas ora apresentadas. Numa dessas incursões, um amigo ilustrador, dos mais talentosos, solicitou-me texto para a revista que estava lançando no mercado. Prontamente lhe enviei o texto. “Envia uma foto também, que é para sair nos colaboradores da revista”. Procurei uma foto legal. Infinitas pastas de fotos no computador. Foto com taça de vinho na mão não serve. Foto de óculos escuros não serve. Foto com a esposa do lado não serve. Foto com as crianças não serve. Foto com barba por fazer não serve. Foto em cemitério não serve. Pois bem, não achei. Lancei mão de uma mais ou menos e recortei com o editor de imagens. Coisa bem artesanal, mesmo. Ficou meia boca. Mandei ao amigo tendo a sensação que não serviria. Pois mal. Não serviu. Aí que, num átimo de segundo, lembrei-me de umas fotos que tinha feito para o lançamento de mais um empreendimento funerário, tiradas por um fotógrafo de esmerada competência e um amigo querido. Pedi a ele para mandar as fotos. Mandou prontamente. Mandei a foto para o amigo da revista. “Essa ficou boa”. Publicou na revista junto do artigo. Orgulho. Quando é fé (expressão do Goiás) o amigo fotógrafo vê a foto na revista. Boa foto. “Cadê os créditos?”. Créditos? Perguntei. “Os créditos da foto”. Mas eu não paguei pelas fotos? Não são minhas? Aí o amigo foi me explicar a questão dos direitos autorais. Nunca tinha me prendido àquelas letras miúdas nos cantos das fotos. Justo, muito justo. Funciona assim com projetos técnicos, obras de arte, textos e também com fotografias. Mas o erro já estava sacramentado. A revista já tinha sido impressa e os créditos não estavam nela. Como justificativa, volto no escrito anteriormente sobre minha necedade em letras. Como reparação (se é que existe) gostaria de pedir desculpas em público. Utilizando o mesmo veículo para tentar consertar o erro e creditar o fato ao autor. Prometo não incorrer mais em tamanha desconsideração. Talvez até proponha tentar sanar a dívida convidando para uma garrafa de vinho. Um Bordeaux por sua vez pode conseguir o feito do perdão. Mas no fundo o que eu gostaria de dizer é que coloquei aquela foto porque o amigo fotógrafo conseguiu um prodígio. Em uma imagem só conseguiu retratar o engenheiro, o coveiro, o escritor e o empreendedor. Por fim, uma pessoa feliz. Feliz não só pelas conquistas empresariais e profissionais, mas ter e poder contar com os amigos nas horas mais importantes.
 
Ao amigo fotógrafo Rimene Amaral. Uma eterna dívida.    
  
* texto escrito para a Revista Local
  
             
 
Guilherme Augusto Santana
Goiânia, sexta feira 19 de setembro de 2014